01 dezembro 2018

Tragédia no mar


Tragédia no Mar, óleo sobre tela de Augusto Gomes (1910–1976)

Na madrugada de 1 para 2 de dezembro de 1947 ocorreu uma terrível tragédia no mar, onde morreram 152 pescadores entre a Aguda (Vila Nova de Gaia) e Leixões. O notável escultor e pintor matosinhense Augusto Gomes evocou esta tragédia num arrepiante quadro, que exprime de forma sublime o desespero dos familiares dos náufragos que acorreram à praia de Matosinhos. É o quadro que se reproduz acima.

Como foi que aconteceu tamanha desgraça? Numa página da Wikipédia dedicada ao funesto acontecimento, pode ler-se:

No dia 1 de dezembro de 1947, as traineiras começaram a chegar ao porto de Leixões com escasso peixe nos porões. A meio da manhã, entrou uma traineira carregada de sardinha e os outros mestres, perspectivando uma boa pescaria, chamaram os seus tripulantes e começaram a aprovisionar os barcos para outra saída. Durante essa tarde, apesar de haver vários prenúncios de temporal, fizeram-se ao mar 103 traineiras que rumaram em direcção à Figueira da Foz. Nessa altura, o espectro da fome era maior do que o do medo (...).

Passadas algumas horas, o tempo mudou radicalmente, vendo-se as traineiras envolvidas num imenso temporal. As ondas fortíssimas chegaram a subir aos 10 metros, enquanto o vento rodava para Noroeste e o ar arrefecia drasticamente. Algumas traineiras resolvem regressar para Leixões, mas a grande maioria decide continuar. Ao anoitecer, a noite ficou negra e sem lua enquanto as nuvens carregadas tapavam completamente o céu e os ventos se transformavam em ciclónicos. Nessa altura, já todos andavam a tentar fugir ao temporal, esforçando ao máximo os motores e as máquinas das traineiras, procurando desesperadamente um porto de abrigo, enquanto que o mar levava marinheiros borda fora e enchia os porões das traineiras de água.

Noite adentro, em terra, corriam murmúrios de que algo corria mal e as pessoas corriam desesperadas em direcção ao areal da praia nova, em Matosinhos. Na cabeça do molhe sul do porto de Leixões, as mulheres e os filhos dos marinheiros apinhavam-se ao vislumbrar as luzes de navegação das traineiras que se aproximavam desesperadamente do porto. Assim que as primeiras traineiras aportaram, relataram as más noticias, tinham sido avistadas, entre a Aguda e o Senhor da Pedra, quatro traineiras a navegar em situação aflitiva muito perto da costa, e que, apesar de alguns mestres terem tentado avisálos e orientá-los para o bom caminho, com as sirenes, sinais e até gritos, nada conseguiram fazer, pois a violência do temporal era tanta que os impediu de conseguirem os seus objectivos.

Finalmente chegou a noticia da trágica realidade e ficou-se a saber que nessa negra e sinistra madrugada de 2 de dezembro de 1947 naufragaram entre a Aguda e Leixões as traineiras “D. Manuel”, “Rosa Faustino”, “Maria Miguel” e “S. Salvador”, tendo perecido um total de 152 marinheiros entre os que se encontravam nas traineiras naufragadas e os que caíram ao mar, deixando 71 viúvas e mais de 100 órfãos.

Das quatro traineiras naufragadas, salvaram-se apenas seis marinheiros, transformando este naufrágio na maior tragédia marítima ocorrida na costa portuguesa.

O jornal A Voz de Leça publicou em novembro de 2007 um artigo do eng. Rocha dos Santos, que nos dá mais alguns pormenores sobre a tragédia. Passo a transcrever um excerto:

Há casos fantásticos, como o daqueles três homens que no reboliço da traineira “D. Manuel”, com o espectro da morte à sua frente, foram arrojados à praia do Cabedelo, procurando ajuda numa das pobres casas aí existentes; ou aqueles dois outros que depois de terem sido roubados de bordo com outros dois camaradas, foram de novo lançados para dentro da traineira, e um dos que o mar não devolveu, mantendo-se agarrado a uma tábua, teve a sorte de por ele passar uma traineira que lhe lançou uma bóia, a qual enfiando-se-lhe milagrosamente pela cabeça, o salvou, ou ainda aquele outro que a bordo da traineira “Rosa Faustino”, passando com terra à vista, se lançou ao mar nadando até à exaustão sendo recolhido das ondas, salvando-se com outros dois arrojados à praia pelo mar!

A notável pintura de Augusto Gomes serviu de inspiração ao escultor coimbrão José João Brito, que procurou reproduzi-la em bronze num grupo escultórico que se encontra na praia de Matosinhos desde 2005.


Tragédia no Mar, grupo escultórico de José João Brito (nascido em 1941), Matosinhos (Foto: Tripadvisor)

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