23 fevereiro 2019

Morreu Sequeira Costa


Sonata para Piano em Fá Menor N.º 23, op. 57 (Appassionata), de Ludwig van Beethoven (1770–1827), pelo pianista português Sequeira Costa (1929–2019)

Quando eu era menino e moço, fui sócio da Juventude Musical Portuguesa. Tinha sido atraído para a chamada música clássica por um professor de Canto Coral que tive no Liceu Alexandre Herculano, no Porto, o maestro José Quelhas. Curiosamente, este professor (parece que ainda está vivo!) era um entusiasta do teatro de revista e foi autor da música de muitas revistas levadas à cena no Teatro Sá da Bandeira... É claro que uma coisa não exclui a outra, isto é, o gosto por um espetáculo eminentemente popular, como é a revista à portuguesa, não exclui o gosto por uma música supostamente mais "séria". A verdade é que o maestro José Quelhas incutiu-me o gosto por esta música "séria" a um ponto tal, que pedi à minha mãe para me inscrever na Juventude Musical. E a minha mãe inscreveu-me.

Um dos primeiros concertos da Juventude Musical a que assisti, se é que não foi mesmo o primeiro de todos, foi um recital que teve lugar no casino da Póvoa de Varzim e que teve como intérpretes, nada mais nada menos, o grande violinista russo Igor Oistrakh e o igualmente grande pianista português Sequeira Costa. Foi um recital que nunca mais esqueci. Saí do casino, no fim do recital, completamente deslumbrado pela música que tinha ouvido. Entre as obras que Igor Oistrakh e Sequeira Costa interpretaram naquele recital, figurou a sonata Appassionata, de Beethoven, que foi magistralmente tocada por Sequeira Costa. Em memória deste extraordinário pianista português agora falecido, aqui relembro a sonata Appassionata, interpretada por ele.

18 fevereiro 2019

Arte islâmica na Sé de Braga


Píxide islâmica em marfim, proveniente do califado de Córdova e mandada fazer pelo califa Abd al-Malik, filho de Almansor. Princípios do séc. XI. Tesouro da Sé de Braga, Braga, Portugal

Almansor, califa de Córdova, foi um notável guerreiro que empreendeu um avanço imparável contra os territórios cristãos do norte da Península Ibérica, chegando ao ponto de arrasar Santiago de Compostela no ano 997. O sino da igreja de Compostela foi levado como troféu para Córdova, às costas de cativos cristãos. Na reconquista que se seguiu, os cristãos apoderaram-se também de numerosos troféus islâmicos, entre os quais a píxide acima representada. Esta píxide tem uma forma tal, que parece ter sido feita de propósito para guardar o cálice e a patena mostrados em baixo, mas não foi. No entanto, é esta a função que ela tem desempenhado até aos dias de hoje.


Cálice e patena em prata dourada, habitualmente guardados na píxide islâmica da Sé de Braga. Este cálice e esta patena foram doados pelo conde portucalense D. Mendo Gonçalves, que morreu no princípio do séc. XI. Tesouro da Sé de Braga, Braga, Portugal

11 fevereiro 2019

Kalunga



Kalunga, pelo agrupamento musical angolano Malambas do Lombe

O título desta peça musical de Angola, Kalunga, pode tomar diversos significados consoante o contexto. Neste caso, parece querer significar "Morte", mas tenho dúvidas, porque não consigo entender a letra, que parece estar em quimbundo da região de Malange.

Kalunga é uma palavra que traz consigo a ideia de infinito, de incomensurável. Em algumas línguas bantus, como o umbundo, Kalunga significa "Deus", "o Criador". Em quimbundo, língua em que Deus é chamado Nzambi, a palavra Kalunga pode ser usada para designar a "Morte", uma entidade sobrenatural (será legítimo chamar-lhe divindade?), que arrebata a alma dos vivos. Esta entidade chama-se, por extenso, Kalunga Ngumba ou Kalunga Ngombe, consoante as regiões, mas é frequentemente chamada apenas Kalunga. Parece-me ser este o caso desta canção. Diga-se a propósito que a divindade contrária, a "Vida", também tem a palavra Kalunga no nome: Kalunga Samba. Além disso, kalunga também significa "mar" em quimbundo.

04 fevereiro 2019

Charneca em flor

Enche o meu peito, num encanto mago,
O frémito das coisas dolorosas…
Sob as urzes queimadas nascem rosas…
Nos meus olhos as lágrimas apago…

Anseio! Asas abertas! O que trago
Em mim? Eu oiço bocas silenciosas
Murmurar-me as palavras misteriosas
Que perturbam meu ser como um afago!

E, nesta febre ansiosa que me invade,
Dispo a minha mortalha, o meu burel,
E já não sou, Amor, Soror Saudade…

Olhos a arder em êxtases de amor,
Boca a saber a sol, a fruto, a mel:
Sou a charneca rude a abrir em flor!

Florbela Espanca (1894-1930)


(Foto: Turismo do Alentejo — ERT)

03 fevereiro 2019

Salúquia (A Bela Moura)


Valsa Salúquia (A Bela Moura), também conhecida como Valsa da Água Castelo por ter sido encomendada pela empresa da Água Castelo, de Alfredo Keil (1850–1907), por Mauro Dilema em piano

01 fevereiro 2019

António Soares


Natasha, 1928, têmpera sobre tela de António Soares (1894–1978), Museu Gulbenkian, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal

António Soares foi um pintor e ilustrador português, nascido em Lisboa em 1894 no seio de uma família humilde. Sem formação académica, António Soares foi autodidata num tempo em que predominavam duas correntes artísticas em Portugal, o naturalismo e o modernismo, as quais influenciaram a sua obra. Foi ilustrador, cenógrafo, decorador, etc. Como pintor, é acusado de ter sido, até certo ponto, convencional, mas podemos encontrar na sua pintura alegadamente académica marcas de modernismo e até mesmo de transgressão. É o caso, por exemplo, do retrato de Maria de Melo Breyner, filha mais velha dos condes de Mafra, que se mostra aqui em baixo, onde a perspetiva é distorcida no sentido de levar o nosso olhar a concentrar-se na pessoa retratada. António Soares morreu em 1978, em Lisboa, no meio de uma injusta e generalizada indiferença por ele e pela sua obra.


Retrato de Maria de Melo Breyner, 1932, óleo sobre tela de António Soares (1894–1978), Museu Gulbenkian, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal


Retrato da Irmã do Artista, 1936, óleo sobre tela de António Soares (1894–1978), Museu Nacional de Arte Contemporânea — Museu do Chiado, Lisboa, Portugal