31 dezembro 2017

Ballet, para não começar um novo ano sempre com valsas de Strauss


Danças Polovtsianas, da ópera Príncipe Igor, de Alexander Borodin, pela Companhia de Bailado do Teatro Bolchoi, de Moscovo, Rússia


Dança da Fada do Açúcar, do bailado O Quebra-Nozes, de Piotr Ilitch Tchaikovsky, por Nina Kaptsova


Dança Ritual do Fogo, do bailado El Amor Brujo, de Manuel de Falla, pela Companhia de Bailado da Fundación Arte Lírico, de Bogotá, Colômbia


Cena da Varanda, do bailado Romeu e Julieta, de Serguei Prokofiev, por Friedemann Vogel e Polina Semionova


Mazurka, do bailado Coppelia, de Léo Delibes, pela Companhia de Bailado do Teatro Bolchoi, de Moscovo, Rússia

29 dezembro 2017

Almada Negreiros


Figurinos da Alfaiataria Cunha, 1913, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal

Está patente no Museu Nacional de Soares dos Reis, aqui no Porto, até ao dia 18 de março de 2018, a exposição “José de Almada Negreiros: desenho em movimento”, que retrata a influência da linguagem cinematográfica na obra do grande artista plástico modernista português, que foi também escritor notável.

José Sobral de Almada Negreiros nasceu na Roça da Saudade, Trindade, São Tomé e Príncipe, em 1893 e faleceu em Lisboa em 1970. Sem nunca ter frequentado qualquer escola de ensino artístico, Almada Negreiros foi no entanto um dos artistas mais importantes do século XX português, graças ao seu génio multifacetado. Embora se tenha distinguido mais como desenhador do que como pintor, aqui mostro algumas das suas pinturas.


Autorretrato num Grupo, 1925, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal


Autorretrato, c. 1927, óleo sobre tela de Almada Negreiros, coleção particular


Duplo Autorretrato, 1934–36, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal. Neste quadro vê-se Almada Negreiros acompanhado da sua mulher, Sarah Afonso (1899–1983), que também foi uma artista plástica de grande valor e teve influência sobre o estilo dele


Primeiro estudo para a decoração do proscénio do Teatro Muñoz Seca de Madrid, 1929, guache sobre papel de Almada Negreiros, Museu de Arte Contemporâneoa do Chiado, Lisboa, Portugal


Maternidade, 1935, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal. Este quadro representa a mulher do artista, Sarah Afonso, com o filho de ambos, José


Retrato do Poeta Fernando Pessoa, 1954, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Museu de Lisboa, Lisboa, Portugal


As Banhistas, óleo sobre tela de Almada Negreiros, Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, Portugal

24 dezembro 2017

Natal up-to-date

Em vez da consoada há um baile de máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
que usarão dominó já na próxima década

Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público

Nas palhas do curral ocultam microfones
O lajedo em redor é de pedras da Lua
Rainhas de beleza vêm de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas

Eis que surge no céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido

Assim a noite passa E passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco

David Mourão-Ferreira (1927-1996), in Cancioneiro de Natal, 1971


Adoração dos Pastores, de Jorge Afonso (c.1470–c.1540), Retábulo da Igreja da Madre de Deus (1515), Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, Portugal

22 dezembro 2017

Cai ou não cai?

Safety Last!, filme mudo norte-americano de 1923, com Harold Lloyd como principal protagonista e realizado por Fred C. Newmeyer e Sam Taylor

"Safety Last!", que no Brasil recebeu o estúpido título de "O Homem Mosca", é um dos mais notáveis filmes de toda a história do cinema, graças à antológica sequência final da escalada, que é hilariante e, ao mesmo tempo, arrepiante. Se há filme que pode ser considerado de suspense em todos os sentidos da palavra, é este. Aproveito para chamar a atenção para o facto de as cenas mais perigosas do filme terem sido protagonizadas pelo próprio Harold Lloyd em pessoa, sem recurso a duplos. O título original do filme, "Safety Last!" (A segurança no fim!), é uma alusão a um aviso existente em locais de trabalho perigosos dizendo "Safety First!" (A segurança primeiro!). Este parece-me ser um filme apropriado para a época festiva de Natal que atravessamos, embora não seja um filme de tema natalício. Por isso o proponho. Além do mais, é um grande filme.

19 dezembro 2017

As adivinhas em anexins


(Foto: João L.)

Um rei quis experimentar o juízo de três conselheiros que tinha, e indo a passear com eles encontrou um velho a trabalhar num campo, e saudou-o:

— Muita neve vai na serra!

Respondeu o velho com a cara alegre:

— Já, senhor, é tempo dela.

Os conselheiros ficaram a olhar uns para os outros, porque era verão, e não percebiam o que o velho e o rei queriam dizer na sua. O rei fez-lhe outra pergunta:

— Quantas vezes te ardeu a casa?

— Já, senhor, por duas vezes.

— E quantas contas ser depenado?

— Ainda me faltam três vezes.

Mais pasmados ficaram os conselheiros; o rei disse para o velho:

— Pois se cá te vierem três patos, depena-os tu.

— Depenarei, real senhor, porque assim o manda.

O rei seguiu seu caminho a mofar da sabedoria dos conselheiros, e que os ia despedir do seu serviço se lhe não soubessem explicar a conversa que tivera com o velho. Eles, querendo campar por espertos, foram ter com o velho para explicar a conversa; o velho respondeu:

— Explico tudo, mas só se se despirem e me derem a roupa e o dinheiro que trazem:

Não tiveram outro remédio senão obedecer; o velho disse:

— Olhem: «Muita neve vai na serra», é porque eu estou cheio de cabelos brancos; «já é tempo dela», é porque tenho idade para isso. «Quantas vezes me ardeu a casa?» é porque diz lá o ditado: «Quantas vezes te ardeu a casa? Quantas casei a filha.» E como já casei duas filhas sei o que isso custa. «E quantas vezes conto ser depenado?» é que ainda tenho três filhas solteiras e lá diz o outro:

Quem casa filha
Depenado fica.

Agora os três patos que me mandou o rei são vossas mercês, que se despiram e me deram os fatos para explicar-lhes tudo.

Os conselheiros do rei iam-se zangando, quando o rei apareceu, e disse que se eles quisessem voltar para o palácio vestidos que se haviam ali obrigar a darem três dotes bons para o casamento das outras três filhas do velho lavrador.

Conto tradicional do Porto, in Contos Tradicionais do Povo Português, por Teófilo Braga

15 dezembro 2017

Os bonecos de Estremoz são Património da Humanidade


Uma oleira de Estremoz fazendo bonecos. Repare-se também na representação do mobiliário tradicional alentejano. Obra de Jorge da Conceição (Foto: Tribuna Alentejo.pt)

Os bonecos de Estremoz foram declarados, com inteira justiça, Património Cultural Imaterial da Humanidade. Porquê os bonecos de Estremoz e não os de Barcelos, das Caldas da Rainha ou de outra terra qualquer? Porque são feitos de maneira diferente. Passemos a palavra ao escritor estremocense Hernâni Matos, investigador entusiasta e divulgador da cultura popular de Estremoz e do Alentejo em geral, na imprensa escrita e no seu blog pessoal Do Tempo da Outra Senhora, que recomendo:

Trata-se de uma manufatura “sui-generis”, distinta de todo o figurado português. Nela, o todo é criado a partir das partes, recorrendo a três geometrias distintas: a bola, o rolo e a placa. São elas que, com tamanhos variáveis, são utilizadas na gestação de cada boneco. Para tal são coladas umas às outras, recorrendo a barbutina e afeiçoadas pelas mãos mágicas dos artesãos, que lhes transmitem vida e significado.

Os bonecos nascem nus e depois vão sendo vestidos e enfeitados, que os bonecos também são vaidosos. Apenas a cara é confecionada com recurso a moldes adequados.

A técnica ancestral de produção de “Bonecos de “Estremoz” transmitiu-se ao longo dos séculos e chegou até nós. Depois da sua manufatura, os bonecos são postos a secar, depois são cozidos no forno e são pintados com cores minerais (…) garridas e alegres, como é timbre das claridades do Sul. Por fim, são protegidos com verniz.

Eu confesso a minha ignorância a respeito das técnicas de trabalhar o barro, apesar de, aqui mesmo ao lado do Porto, ter existido uma grande tradição de manufatura de bonecos (para presépios, cascatas sanjoaninas, etc.) em Vila Nova de Gaia. Não foi por acaso que nasceram em Vila Nova de Gaia alguns dos maiores escultores portugueses, como Soares dos Reis, Teixeira Lopes, Diogo de Macedo, etc. Também na Maia houve grandes santeiros (talvez ainda exista algum), que eram homens do povo cujas imagens se encontram em tudo quanto é capela, igreja ou catedral, em Portugal e no Brasil, e que também trabalhavam o barro, entre outros materiais.


Presépio, de Afonso Ginja (Foto: Hernâni Matos)


O Amor É Cego, de Ricardo Fonseca (Foto: Hernâni Matos)


Primavera, de artista não identificado, Museu Nacional de Etnologia, Lisboa


O Cirurgião ou Barbeiro-Sangrador, de artista não identificado (Foto de autor não identificado)

09 dezembro 2017

Os homens gloriosos

Sentei-me sem perguntas à beira da terra,
e ouvi narrarem-se casualmente os que passavam.
Tenho a garganta amarga e os olhos doloridos:
deixai-me esquecer o tempo,
inclinar nas mãos a testa desencantada,
e de mim mesma desaparecer,
— que o clamor dos homens gloriosos
cortou-me o coração de lado a lado.

Pois era um clamor de espadas bravias,
de espadas enlouquecidas e sem relâmpagos,
ah, sem relâmpagos…
pegajosas de lodo e sangue denso.

Como ficaram meus dias, e as flores claras que pensava!
Nuvens brandas, construindo mundos,
como se apagaram de repente!

Ah, o clamor dos homens gloriosos
atravessando ebriamente os mapas!

Antes o murmúrio da dor, esse murmúrio triste e simples
de lágrima interminável, com sua centelha ardente e eterna.

Senhor da Vida, leva-me para longe!
Quero retroceder aos aléns de mim mesma!
Converter-me em animal tranquilo,
em planta incomunicável,
em pedra sem respiração.

Quebra-me no giro dos ventos e das águas!
Reduze-me ao pó que fui!
Reduze a pó minha memória!

Reduze a pó
a memória dos homens, escutada e vivida…

Cecília Meireles (1901–1964), poetisa brasileira



07 dezembro 2017

Os quatro rios do Paraíso


Os quatro rios do Paraíso, do pintor flamengo Peter Paul Rubens (1577–1640), Kunsthistorisches Museum, Viena, Áustria. O título deste óleo sobre tela remete-nos para os quatro rios do jardim do Éden referidos na Bíblia: Pison, Geon, Tigre e Eufrates (Genesis 2, 10–14). Segundo uma outra interpretação, este quadro representa as quatro partes do Mundo acompanhadas pelos seus rios principais. De acordo com esta interpretação, em primeiro plano e à esquerda, está a África com o Rio Nilo; à direita e imediatamente atrás do tigre, está a América e o Rio da Prata; em último plano e à esquerda, a Europa está acompanhada pelo Rio Danúbio; em último plano e à direita, a Ásia faz-se acompanhar pelo Rio Ganges

03 dezembro 2017

Leve, leve, o luar

Leve, leve, o luar de neve
goteja em perlas leitosas,
o luar de neve e tão leve
que ameiga o seio das rosas.

E as gotas finas da etérea
chuva, caindo do ar,
matam a sede sidérea
das coisas que embebe o luar.

A luz, oh sol, com que alagas,
abre feridas, e a lua
vem pôr no lume das chagas
o beijo da pele nua.

Afonso Lopes Vieira (1878–1946)