31 março 2013

Exaltação e ação de graças


Preis und Dank, da Oratória da Páscoa, BWV 249, de Johann Sebastian Bach (1685-1750), pelo Collegium Vocale Gent, dirigido por Philippe Herreweghe

30 março 2013

O soldado morto

Os infinitos céus fitam seu rosto
absoluto e cego
E a brisa agora beija a sua boca
Que nunca mais há-de beijar ninguém.

Tem as duas mãos côncavas ainda
De possessão de impulso de promessa.
Dos seus ombros desprende-se uma espera
Que dividida na tarde se dispersa.

E a luz, as horas, as colinas
São como pranto, em volta do seu rosto
Porque ele foi jogado e foi perdido
E no céu passam aves repentinas.

Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)

Funeral de um militar português em Mueda, norte de Moçambique (Foto: SRG)

29 março 2013

Crux Fidelis


Crux Fidelis, do rei de Portugal D. João IV (1604-1656), pelo grupo vocal inglês The King's Singers

28 março 2013

Sacramento da Última Ceia

Sacramento da Última Ceia, óleo sobre tela pintado em 1955 por Salvador Dalí (1904-1989), National Gallery of Art, Washington DC, Estados Unidos da América

24 março 2013

Valsa Triste


Versão para canto a capella da Valsa Triste, do compositor finlandês Jean Sibelius (1865-1957), pelo grupo vocal Rajaton, também finlandês

21 março 2013

Há um veneno em mim

Há um veneno em mim que me envenena,
um rio que não corre, um arrepio,
há um silêncio aflito quando os ombros
se cobrem de suor pesado e frio.

Há um pavor colado na garganta,
e tiros junto à noite, e o desafio
(algures na escuridão) de alguma coisa
calando o fraco apelo que eu envio.

Há um papa que morre enquanto escrevo
estas linhas de angústia e solidão
há o fogo da Breda, os olhos gastos.

Há a mulher que espera confiada
um pálido vazio aerograma;
e há meu coração posto de rastos.

Fernando Assis Pacheco (1937-1995)


Breda — Metralhadora pesada usada na Guerra Colonial, habitualmente montada em viaturas militares

Aerograma — Espécie de carta sem sobrescrito, inventada por Fernando Pessoa


Um aerograma do tipo usado na correspondência entre os militares portugueses destacados em África e as suas famílias (Foto: Museu do Papel)

20 março 2013

Finalmente é primavera!


Petite Fleur, por Sidney Bechet (1897-1959)

19 março 2013

Ler à luz de uma bola de futebol

(Foto: Uncharted Play Inc.)

Uma companhia start-up de Nova Iorque, chamada Uncharted Play Inc., desenvolveu e pretende comercializar uma bola de futebol, chamada SOCCKET, que capta energia cinética que é aplicada à bola durante um jogo e a armazena numa bateria existente no seu interior, para ser utilizada mais tarde sob a forma de eletricidade. O projeto inicial nasceu na Universidade de Harvard e foi desenvolvido por Jessica O. Matthews e Julia Silverman.

Além da bateria já referida, a bola tem no seu interior um pequeno gerador giroscópico que rola livremente e que produz energia elétrica a partir da sua rotação. A potência do gerador não é muita, é apenas de 6 W. Mesmo assim, um jogo de futebol com a duração de trinta minutos consegue produzir energia suficiente para que uma "lâmpada" de LED ligada à bola dê luz durante três horas, pelo menos.

A empresa fabricante, que está agora numa fase de angariação de fundos, pretende também desenvolver outros acessórios para serem ligados à bola, tais como um carregador de iPhone, um esterilizador de água para ser usado no Terceiro Mundo, etc.


(Foto: Uncharted Play Inc.)

13 março 2013

Che farò senza Euridice?


Ária Che farò senza Euridice?, da ópera Orfeu e Eurídice, de Christoph Willibald Gluck (1714-1787), cantada por Janet Baker, no papel de Orfeu, durante a atuação com a qual esta notável mezzo-soprano inglesa pôs fim à sua carreira operática. Esta atuação teve lugar em Glyndebourne, Inglaterra, em 17 de julho de 1982

12 março 2013

Reflexões de Eduardo Lourenço

Eduardo Lourenço (Foto: Nelson Garrido)

Por um acaso, encontrei uma entrevista dada a Luís Miguel Queirós pelo pensador e ensaísta Eduardo Lourenço em 13 de maio de 2007. No que respeita aos assuntos propriamente políticos, a entrevista está bastante datada. Mesmo assim, parece-me que é de interesse destacar alguns excertos. A entrevista completa está disponível em http://static.publico.pt/docs/cultura/eduardolourenco/default.htm.

... eu ia perguntar se a sua obra, desde “O Labirinto da Saudade”, não passa também um pouco essa ideia de que o país sofre de uma espécie de bloqueio profundo, e não há volta a dar-lhe?

A história de Portugal é, de facto, singular. Os portugueses foram para todo o lado, mas nunca saíram, levaram a casinha com eles. (...)

(...) a nossa tendência é a de vivermos guetizados. Agora estamos todos, seja aqui ou na Patagónia, a ver o mesmo ecrã. É como o cosmonauta que viu a Terra de fora pela primeira vez. Só que agora a vemos na televisão ou na internet. No entanto, a verdade mais profunda é que a televisão serviu, sobretudo, para aproximar internamente o país. Vila Real e Bragança estão em Lisboa e vice-versa. O país está mais pequeno, mais compacto. Mas, ao mesmo tempo, há uma auto-guetização. Veja um acontecimento como o das qualificações académicas do primeiro-ministro, sem dimensão, sem interesse, nem dentro nem fora de fronteiras, mas que pode ocupar o país um mês inteiro – e ainda a procissão vai na praça. Isto numa altura em que se estão a passar no mundo coisas importantes, que interessam aos destinos da humanidade.

A televisão tem esta capacidade de estar em toda a parte, mas é um espelho que também nos pode reduzir à dimensão de um quarto de dormir. Estamos todos na mesma casa-de-banho. Continuamos numa ilha, agora com vistas para o mundo inteiro, mas que são só vistas. O que nos interessa mesmo é o que se passa cá em casa. Mais uma vez, o Eça ilustrou isto: “O que nos interessa é o pé da Luisinha”. (...)

Acha que a Europa não nos interessa?

A nossa entrada na Europa foi um acontecimento capital na história portuguesa moderna. Agora estamos na Europa, politicamente e comercialmente, a tempo inteiro. O nosso espaço é objectivamente o da Europa. As nossas empresas têm de ter uma dimensão europeia, se não afogamo-nos aqui e enfrentamos uma regressão que não poderemos suportar. Mas nem por isso conhecemos mais a Europa. Não é só Portugal. Os países continuam culturalmente muito em casa, separados não só por uma história de séculos, mas pelas suas diferentes línguas. E nada separa mais do que as línguas. Quantas mais línguas falamos, mais pátrias temos. E agora temos todos uma espécie de nova pátria, que é o inglês. (...)

As novas gerações têm agora essa leitura do mundo em inglês, para efeitos práticos. A alguns o inglês também lhes permitirá aceder a uma grande literatura. É uma coisa excelente. Como o foi o francês na minha geração. (...)

Não alinhou nas grande utopias políticas do século XX, mas, a julgar pelo que vem escrevendo, também não parece ver com bons olhos este mundo em que o sucesso económico é já quase o único ideal mobilizador.

Sim, essa é agora a regra imperativa, a título individual e colectivo. O mundo é uma Bolsa. E, portanto, o jogo político, que tinha uma dimensão própria, é hoje o subproduto de um jogo muito mais profundo e radical, que é o das forças de transformação da sociedade, que são de ordem económica, financeira e científica. São elas que comandam tudo o resto. A política, nas sociedades que se querem democráticas, é apenas a maneira de utilizar esses meios da maneira mais aceitável. Mas o ímpeto, o motor da civilização em que estamos, não tem nada de democrático em si mesmo. É uma força cega, como se fosse uma força da natureza, ainda que seja humana. O deus, a que as sociedades se referiam quando ainda havia uma referência transcendente, desapareceu, e estamos agora diante de fenómenos de dinâmica pura. Tudo passa pelos fins da máquina produtiva mundial, que se torna mais abstracta ainda por ser, fundamentalmente, do tipo financeiro. (...)

In Pública, suplemento do jornal Público, domingo, 13 de maio de 2007

08 março 2013

Mulheres de Atenas


 Para assinalar o Dia Internacional da Mulher, uma canção irónica de Chico Buarque:  Mulheres de Atenas 

06 março 2013

Mamã Muxima

Na Polónia florida e na terra dos Bascos
Na terra dos Teutões e na Tíndari dos Sículos,
Na Suíça polida e na Itália gentil,
Em muita outra parte, é pura verdade
Que é como preta que a Virgem veneram.

Bem sei que Murillo o impossível pintou,
E que Velasquez, o divino, de Rafael é rival.
Quem não viu em Madrid, quem não viu em Florença,
Milagres de pintura, assombros de cor?
Mas vê como passa essa turba fastienta
Diante de um retábulo de tanto requinte!
Parece sonâmbula, pensa noutra coisa,
Tem o sorriso frio de gente sabedora:
É gente erudita que leu Kant, conhece Espinosa...
Do que não suspeita, por certo, é que tem
a alma defunta...

Outra coisa é este meu povo, este povo sofredor
Gente do "mato" e do chimbeco em Luanda,
— A Velha Mutudi, a tia Ximinha;
Gente que ri, porque sabe o que é chorar;
Gente que cumprimenta, porque sabe o que é desprezo,
Gente que reza e finge zanga à Senhora.
Mas é certo e seguro, nem posso duvidar
Que tem amor, muito amor consigo esta gente.
Há nela essa fé que o Senhor diz fazedora de milagres.

Entre a Virgem do céu e este povo que sofre
Há funda amizade, há infinda ternura
Por isso eu não me rio, nem estranho sequer
Quando vejo gritar, simular grande zanga
Se tarda o milagre, ó Virgem Senhora!

Elas sabem como tomar-Te, entendem-Te tão bem!
Como roçam as mãos e os rostos também
No Teu manto bendito, bendita Mãe!
Pois é este povo que não estranha
Que sejas branca e também sua Mãe!
Mas sou eu quem Te faz a pergunta:
Porquê és assim?
Preta bem preta, nas terras dos brancos,
Branca bem branca na terra dos pretos!
— Não vês, meu filho, que vos quero lembrar
Que sois todos meus, meus pequeninos?
Assim vos não esqueçais que brancos ou pretos
Tendes a vossa Mãe que também é Morena:
Branca muito branca, na terra dos Pretos,
Preta bem preta, na terra dos Brancos:
O que conta para mim não é a cor,
Basta-me o coração: "Muxima!".

D. Alexandre do Nascimento, cardeal arcebispo emérito de Luanda

NOTA — Muxima significa coração em quimbundo.

Santuário de Nossa Senhora da Muxima, Angola (Foto de António Feijão)

01 março 2013

Traz outro amigo também



Traz outro amigo também, por Zeca Afonso (1929-1987)