Música angolana
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A gravação foi feita em Zemba, que fica no município de Nambuangongo, mais concretamente no canto nordeste da província do Bengo, a poucos quilómetros da "fronteira" com a província do Uíge. O seu intérprete é um habitante local chamado Gabriel António. A língua em que ele canta é o quimbundo tal como se fala na região dos Dembos, o qual apresenta algumas diferenças em relação ao quimbundo de Luanda.
Ainda uma palavra se impõe a propósito do uso de uma viola de fabrico europeu na gravação. A viola é um instrumento que entrou definitivamente no uso corrente das populações da região dos Dembos. Um pouco por toda a região se tocam violas que são fabricadas de maneira artesanal pelos próprios que as tocam. Por isso, é justo que se considere a viola como um instrumento musical angolano de facto, a par da marimba, do quissanje (ver figura), da ngoma, da puita, etc.
Afinal de contas, também a chamada guitarra portuguesa era inglesa antes de ser introduzida em Portugal. Ela veio do exterior e foi adoptada pelos portugueses como sendo sua. Porque não, pois, considerar a viola como um instrumento angolano?
No caso específico desta gravação, o intérprete estava tão contente por pôr as suas mãos numa viola "profissional", que não tive coragem para lhe pedir que tocasse, não aquela, mas a sua própria viola artesanal.
A gravação pode ser ouvida neste endereço.
A figura que ilustra este artigo foi descaradamente roubada do blog O Abre-Surdo.
Comentários: 12
Lazuli, obrigado pela visita e pelo elogio. Gostei muito do seu blog. Vai já para a minha galeria.
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Meu amigo tuxi ;-)
Obrigada pela música. Ao ouvi-la soou-me como se o Gabriel estivesse a dedilhar um likembe (seria da qualidade menos boa do som ou da técnica de execução, mesmo?)
É isso mesmo, como dizes. Quando nos apropriamos de algo e isso nos serve, passa a ser nosso e é incorporado no que possuíamos já.
E não é essa apropriação que fere a "tradição" (ela própria uma realidade porosa).
Um beijo e obrigada pela partilha.
(Tenho a música no computador e desde ontem que a oiço de vez em quando. A melodia é simples. É bonita...)
É a alegria genuína do tocador, a pureza dos sons e a empatia pelo texto do denudado que faz desta partilha puro prazer misturado com saudade.
Obrigada!
Fico feliz por saber que a música agradou.
Pwo, a forma como o Gabriel António dedilhou a viola foi a forma normal, pois as violas que se fazem na região dos Dembos são bastante parecidas com as violas europeias.
É evidente que, não sendo propriamente luthiers, eles fazem as suas violas com umas formas um bocado toscas e com a madeira em bruto, sem polimento nem verniz de qualquer espécie. Mas elas têm um som bastante bom, apesar do aspecto.
Quanto à semelhança que encontraste com o som do likembe ou quissanje, ela não deve resultar só da má qualidade do som, concerteza. Esta balada é o tipo de música que se costuma cantar com acompanhamento de quissanje. Como sabes melhor do que eu, o quissanje é um instrumento de uso pessoal, sobretudo. Ele é para ser ouvido pela pessoa que o toca e (quase) mais ninguém. O quissanje é, portanto, um companheiro de alguém que quer estar só consigo próprio e quer "deitar cá para fora" aquilo que lhe vai na alma: a saudade de alguém que está ausente, um amor não correspondido, o lamento pela morte de alguém, etc.
Dada a sua portabilidade, o quissanje é também um companheiro privilegiado daqueles que viajam através do mato e que, tocando e cantando à medida que vão caminhando, se sentem menos sós. O quissanje é, por isso, um instrumento a que o africano do mato dá grande valor.
Pwo, só mais um pormenor: podes chamar-me os nomes que quiseres, mas tuji é que não. ;-)
pelo Desabafos Angolanos encontrei-e.
gostei do texto e principalmente da musica, levou a minha Angola por 5:27 (risos).
para já expor-te no meu Attelier é uma obigação por tudo que por aqui li.
o melhor da música é o carinho que tens por ela e pelas gentes.
Caro Denudado,
Só hoje consegui voltar à net, mas ainda a tempo do meu esclarecimento ao teu "pormenor".
Embora acredite que estavas a brincar, quero deixar claro que jamais cometeria tamanha deselegância.
Apenas respondi com tuxi (nu; denudado) ao teu muhatu (mulher; pwo) em Kimbundu.
Não domino essa língua, mas possuo um dicionário (quiçá o mesmo que tu) que me vai dando umas dikas.
Um abraço
:-/
O meu pormenor ;-)
Sempre é mais aceitável trocar kisanji por likembe ou até malimba. Embora não seja o mesmo, ambos são instrumentos da mesma classe.
»:-O
Muito prezada Pwo. Claro que eu estava a brincar quando fiz o trocadilho tuxi/tuji. Por isso é que acrescentei este piscar de olho: ;-)
Não me passaria minimamente pela cabeça ser grosseiro para contigo, depois da forma tão amistosa como sempre me tens tratado.
Quanto à tua referência ao dicionário de quimbundo (desculpa lá esta ortografia portuguesa, mas ela é usada há muitos anos e não vejo razões para mudá-la, dado que é em português que estou a escrever), a verdade é que não tenho dicionário nenhum.
O que eu tenho é um pequeno vocabulário a que faltam inúmeras palavras. Respiguei-o de uma gramática que encontrei na Biblioteca Pública Municipal do Porto, chamada "Grammatica Elementar do Kimbundu ou Língua de Angola", da autoria de Héli Chatelain e publicada em Genebra em 1895. Esta gramática permitiu-me consolidar um pouco e sistematizar os parcos conhecimentos empíricos de quimbundo que trouxe de Angola.
Xala kiambote, kamba diami.
Denudado
Xala kiambote, kamba diami = Fica bem, minha amiga.
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