25 abril 2012

O 25 de Abril em Angola

Esta fotografia, feita em Luanda pouco depois do dia 25 de abril de 1974, documenta um tempo singular: um tempo em que o povo perdeu o medo à PIDE/DGS e os pides ficaram com medo do povo. (Foto de autor desconhecido)

A Revolução de 25 de abril de 1974 não chegou logo a Angola. Longe disso. Demorou mesmo muito tempo a chegar e sempre com muitas resistências e contradições. Como exemplo deste facto, refira-se que a libertação dos presos políticos do campo de concentração de São Nicolau, no sul do território, só ocorreu em 13 de maio.

A fotografia que encabeça este artigo e que documenta uma contestação à PIDE/DGS em Luanda tem assim razão de ser, pois a polícia política não foi extinta em Angola logo no próprio dia 25 de abril de 1974, como aconteceu em Portugal. Com efeito, o decreto 171/74, da Junta de Salvação Nacional, determinou que, «depois de saneada», a PIDE deveria tornar-se uma Polícia de Informação Militar «nas províncias em que as operações militares o exigirem». Tendo a PIDE sido uma corporação que desenvolveu tantas e tão graves ações em Angola, ao serviço do mais nefando colonialismo, como é possível que alguém tenha imaginado ser possível aproveitar alguns dos seus agentes para prestarem serviço na tal Polícia de Informação Militar? Quem com tanto zelo serviu o Estado Novo, por certo não iria servir com igual empenho o regime que o derrubou.

Pois bem. Ao contrário do que se tem escrito, a PIDE deixou mesmo, em grande parte, de funcionar em Angola, fosse na qualidade de Polícia de Informação Militar ou noutra qualidade qualquer. A rede de agentes e de informadores que a PIDE tinha no território desfez-se, logo que se tornou claro que o derrube do Estado Novo era definitivo. Os pides não ficaram à espera para ver no que é que aquilo tudo iria dar. Puseram-se em fuga para a Namíbia (que então estava sob domínio sul-africano) ou passaram à clandestinidade, deixando os "serviços" espalhados pela colónia ao abandono. Quando, mais tarde, a própria Polícia de Informação Militar foi extinta, não foi feito mais do que a formalização de um facto que já estava consumado. Os pides já se tinham encarregado de "extinguir" a tal Polícia de Informação Militar.

Muitas outras resistências e contradições houve em Angola no imediato pós 25 de Abril. Logo no mês de maio, o general Silvino Silvério Marques, que tinha servido fielmente o colonialismo como governador-geral de Angola, voltou a ocupar o mesmo cargo, com resultados vergonhosos. Durante este seu segundo governo, que durou até julho de 1974, a situação em Luanda deteriorou-se de forma muito grave, com repetidos e insistentes ataques feitos contra os bairros populares da cidade (chamados musseques) por parte de grupos de colonos extremistas, do que resultaram numerosos mortos e feridos, sem que alguém tomasse medidas para pôr cobro a tal situação.


Esta segunda fotografia, de um anúncio de jornal, foi publicada num fórum aqui na Internet por uma pessoa que usa o pseudónimo Ruca. Segundo o que Ruca escreveu no fórum, este anúncio foi publicado num jornal de Luanda em 8 de maio de 1974.

A OPVDCA (Organização Provincial de Voluntários para a Defesa Civil de Angola) era uma força paramilitar contituída quase exclusivamente por brancos. Dependia diretamente do governador-geral de Angola, escapando por isso completamente ao controlo das Forças Armadas Portuguesas. Até os chefes militares mais afetos ao regime viam a OPVDCA com muito maus olhos, pois a ação desta organização transcendia a sua própria competência, que seria de defesa das vidas e bens dos colonos, e interferia com a atividade operacional das Forças Armadas nas zonas de guerra. Em concreto, a OPVDCA realizou ataques contra as populações civis afetas aos movimentos de libertação, em colaboração com fazendeiros brancos de café, sendo a população civil da 1ª Região do MPLA um seu alvo preferencial.

Com que fim é que a OPVDCA se propôs, já depois de 25 de abril de 1974, recrutar antigos militares oriundos dos batalhões metropolitanos, dos comandos e dos paraquedistas — isto é, antigos militares com experiência de guerra e que fossem brancos — para as suas fileiras? Terá a OPVDCA desempenhado algum papel nos ataques aos musseques referidos acima? Aqui ficam as minhas interrogações, pois não tenho resposta para elas.

Comentários: 1

Anonymous Anónimo escreveu...

Obrigado pelo trabalho. Estando a escrever um romance passado em Angola entre 1973 e 1975 encontrei aqui respostas para algumas questões que investigava.

23 janeiro, 2014 15:28  

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