03 novembro 2012

Portugueses em terras do Preste João


Primeira ponte portuguesa sobre o Rio Nilo Azul, que é afluente do Nilo, construída no séc. XVI nas proximidades de imponentes cataratas (Foto de autor desconhecido)

Em 1487, o rei de Portugal, D. João II, enviou dois emissários em busca de um mítico soberano cristão, rico e virtuoso, que viveria para os lados do Oriente e que era conhecido como Preste João. Estes dois emissários eram Afonso de Paiva e Pêro da Covilhã. O rei, que planeava uma expedição marítima para a Índia, pretendia estabelecer uma aliança com esse poderoso soberano, para que ele auxiliasse os portugueses na sua expansão para o Oriente. Afonso de Paiva morreu antes de terminar a missão para que fora enviado, mas Pêro da Covilhã completou-a, depois de ter andado pela Índia e outras terras, onde recolheu muita e valiosíssima informação sobre as rotas comerciais das especiarias.

O lendário reino cristão do Preste João era na realidade o Império Etíope, que tinha tido os seus anos de grandeza no passado, mas que, no tempo em que Pêro da Covilhã a ele chegou, se encontrava muito empobrecido e ameaçado pela Turquia e outras potências islâmicas, que pretendiam conquistá-lo. Em vez de estar em condições de prestar apoio aos portugueses, o imperador Alexandre da Etiópia, descendente do Preste João, é que precisava de ser ajudado a resistir às investidas muçulmanas.

Pêro da Covilhã foi muito bem recebido pelo imperador, que o cumulou de honras e de riquezas. O português ficou na Etiópia, onde casou, teve muitos filhos e se tornou num poderoso senhor feudal. Faleceu por volta de 1530.

Em 1541, a pedido do imperador Cláudio, que sucedeu a Alexandre, chegou à Etiópia uma expedição militar portuguesa, composta por cerca de 400 homens bem armados e equipados, comandada por Cristóvão da Gama, filho mais novo de Vasco da Gama e irmão do então vice-rei da Índia, Estêvão da Gama. A Etiópia estava então a ser atacada por forças muçulmanas vindas dos lados da Eritreia. As tropas portuguesas defrontaram-nas sozinhas e venceram-nas em duas batalhas.

No entanto, por razões que se desconhecem, Cristóvão da Gama não juntou as suas forças às da Etiópia. Ao mesmo tempo, as tropas islâmicas receberam reforços turcos. Travou-se então uma terceira batalha em 1542, que opôs portugueses a muçulmanos e que resultou numa derrota para os portugueses. O próprio Cristóvão da Gama foi capturado pelo inimigo e acabou por ser decapitado.

Os cerca de 100 portugueses que sobreviveram à batalha juntaram-se, então sim, às tropas etíopes e, em princípios de 1543, participaram numa outra batalha, em que etíopes e portugueses infligiram uma estrondosa derrota aos invasores, que se puseram em fuga. Esta vitória foi decisiva para a manutenção da Etiópia como reino cristão independente.


Segunda ponte portuguesa sobre o Rio Nilo Azul, também do séc. XVI. Esta ponte foi destruída em 1945, numa tentativa para travar o avanço das tropas italianas enviadas por Mussolini para conquistar a Etiópia (Foto: Krfrantz)

Vindos juntamente com Cristóvão da Gama ou pouco tempo depois, um grupo de padres jesuítas chegou também à Etiópia.

Nos princípios do século XVII, o jesuíta Pêro Pais conseguiu convencer o então imperador, Susneyos, a aderir à Igreja de Roma, em vez da Igreja Ortodoxa Copta local. Depois da conversão do imperador, chegaram mais jesuítas, os quais, com o proselitismo militante que os caracterizava, tentaram impor diversas mudanças às práticas religiosas até então seguidas pelos etíopes. Isto resultou numa revolta, a que se seguiu uma guerra civil. O imperador Susneyos acabou por ter que abdicar.

Sucedeu-lhe o seu filho Fasiledes, que restaurou a Igreja Ortodoxa Copta como igreja oficial do estado e expulsou os jesuítas em 1633. A saída da Companhia de Jesus marcou o fim da presença portuguesa em terras do Preste João.


Castelo de Fasiledes, assim chamado por ter sido mandado construir pelo imperador Fasiledes (1632-1667), em Gondar, que foi a capital da Etiópia durante cerca de duzentos anos. É evidente a influência portuguesa no estilo deste castelo, que deve ter sido obra de um arquiteto goês. Este e outros castelos, mandados construir por Fasiledes e por seu filho e neto, são por vezes chamados "castelos portugueses". Além dos castelos e outras construções, a cidade imperial de Gondar tem quarenta e quatro igrejas e está classificada como Património Mundial (Foto: Dulce Rodrigues)

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