13 setembro 2024

Namoro


Mandei-lhe uma carta em papel perfumado
e com letra bonita eu disse ela tinha
um sorrir luminoso tão quente e gaiato
como o sol de Novembro brincando de artista nas acácias floridas
espalhando diamantes na fímbria do mar
e dando calor ao sumo das mangas
Sua pele macia — era sumaúma…
Sua pele macia, da cor do jambo, cheirando a rosas
sua pele macia guardava as doçuras do corpo rijo
tão rijo e tão doce — como o maboque…
Seus seios, laranjas — laranjas do Loge
seus dentes… — marfim…
Mandei-lhe essa carta
e ela disse que não.

Mandei-lhe um cartão
que o amigo Maninho tipografou:
«Por ti sofre o meu coração»
Num canto — SIM, noutro canto — NÃO
E ela o canto do NÃO dobrou

Mandei-lhe um recado pela Zefa do Sete
pedindo rogando de joelhos no chão
pela Senhora do Cabo, pela Santa Ifigénia,
me desse a ventura do seu namoro…
E ela disse que não.

Levei à avó Chica, quimbanda de fama
a areia da marca que o seu pé deixou
para que fizesse um feitiço forte e seguro
que nela nascesse um amor como o meu…
E o feitiço falhou.

Esperei-a de tarde, à porta da fábrica,
ofertei-lhe um colar e um anel e um broche,
paguei-lhe doces na calçada da Missão,
ficámos num banco do largo da Estátua,
afaguei-lhe as mãos…
falei-lhe de amor… e ela disse que não.

Andei barbudo, sujo e descalço,
como um mona-ngamba.
Procuraram por mim
«— Não viu… (ai, não viu…?) não viu Benjamim?»
E perdido me deram no morro da Samba.

Para me distrair
levaram-me ao baile do sô Januário
mas ela lá estava num canto a rir
contando o meu caso às moças mais lindas do Bairro Operário

Tocaram uma rumba — dancei com ela
e num passo maluco voámos na sala
qual uma estrela riscando o céu!
E a malta gritou: «Aí, Benjamim!»
Olhei-a nos olhos — sorriu para mim
pedi-lhe um beijo — e ela disse que sim.


Viriato da Cruz (1928–1973), poeta angolano


GLOSSÁRIO

jambo — nome de frutos comestíveis de diversas espécies; neste caso, certamente Viriato da Cruz se referia a um fruto de origem hindustânica, também chamado jamelão, que adquire uma cor negra quando maduro

maboque — fruto comestível e sumarento, do tamanho e cor de uma laranja, casca dura e polpa agridoce

Loge — o mesmo que Vale do Loge, região produtora de laranjas muito doces e sumarentas, na província do Uíge

quimbanda — curandeiro, adivinho, praticante de magia branca

mona-ngamba — trabalhador forçado



Namoro, poema de Viriato da Cruz e música de Fausto Bordalo Dias, numa interpretação de Fausto

11 setembro 2024

Elmar Oliveira, um violinista luso‑americano


Mazurka N.º 2, do compositor polaco Henryk Wieniawski (1835–1880), pelo violinista norte-americano Elmar Oliveira e o pianista chinês Tao Lin

09 setembro 2024

O Moscóforo


O Moscóforo (portador de bezerro), 570–550 A.C., escultura de mármore de autor desconhecido. Museu da Acrópole, Atenas, Grécia
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O Moscóforo é uma escultura grega arcaica do tipo kouros, que representa um homem com um bezerro às costas, provavelmente para ser sacrificado aos deuses. Esta estátua está muito danificada e foi encontrada na Acrópole no meio de uma pilha de destroços, resultantes das destruições provocadas pelos persas em 480 A.C. Também faltam os olhos, que consistiriam em pequenas pedras de cor.

05 setembro 2024

Manhã de setembro


Matinée de septembre, 1912, óleo sobre tela do pintor francês Paul Chabas (1869–1937). Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque, Estados Unidos da América
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Apesar de o nome deste quadro se referir a uma manhã de setembro, ele não foi pintado em setembro, mas sim em três verões sucessivos. O cenário representado é o do Lago de Annecy, Haute-Savoie, França. A pose encolhida da modelo, assim como o ambiente brumoso que o artista criou a envolvê-la, transmitem-nos uma sensação de manhã fria de setembro. Quase sentimos um arrepio ao ver esta jovem com os pés metidos na água, que adivinhamos gelada.

Este quadro esteve exposto em Paris sem qualquer controvérsia e até foi premiado. A seguir, foi levado para os Estados Unidos, onde foi considerado indecente, por mostrar uma mulher nua. O escândalo que o quadro provocou na conservadora América acabou por se revelar uma excelente promoção e o quadro ficou famoso. Fizeram-se várias edições de reproduções impressas dele, que se venderam muito bem.

03 setembro 2024

Marques de Oliveira


Retrato de Manuel Teixeira Gomes, 1881, óleo sobre tela de João Marques de Oliveira (1853–1927). Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto
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Praia de Banhos, Póvoa de Varzim, 1884, óleo sobre tela de João Marques de Oliveira (1853–1927). Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Lisboa
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Autorretrato, c. 1915–1920, óleo sobre madeira de João Marques de Oliveira (1853–1927). Museu Nacional de Soares dos Reis, Porto
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João Marques de Oliveira foi um destacado pintor realista português, nascido no Porto em 1853 e falecido na mesma cidade em 1927. Foi introdutor do Naturalismo em Portugal juntamente com o pintor António Carvalho da Silva, que adotou o nome de Silva Porto, por ser também natural do Porto.

Marques de Oliveira começou por estudar na Academia Portuense de Belas Artes, onde frequentou as disciplinas de Desenho Histórico, Arquitetura Civil e Perspetiva, primeiro, e fez o curso completo de Pintura Histórica, depois. Foi com uma pensão do Estado para Paris, juntamente com o seu colega Silva Porto, a fim de estudar na Escola Nacional de Belas Artes francesa, onde travou conhecimento com os movimentos naturalista e impressionista. Aproveitou a oportunidade para viajar também pelos Países Baixos, Bélgica e Itália.

Depois de concluir os seus estudos no estrangeiro, Marques de Oliveira regressou a Portugal, onde continuou a dedicar-se à pintura e participou ativamente na realização de diversas iniciativas que visavam o progresso das Artes no nosso país.

Em 1881, aconteceu uma reforma das Academias de Belas Artes do Porto e de Lisboa, do que resultou a criação de duas Escolas de Belas Artes, uma em cada cidade, com vocação para o ensino superior artístico. Marques de Oliveira, que era docente da Academia Portuense de Belas Artes, tornou-se então professor da Escola de Belas Artes do Porto, da qual chegou a ser diretor. Abandonou a sua longa carreira de 45 anos ao serviço do ensino artístico em 1926 e um ano depois faleceu, com 74 anos de idade.

Paralelamente à sua atividade docente, durante a qual empreendeu várias reformas do ensino na sua escola, Marques de Oliveira produziu numerosas obras pictóricas de grande qualidade artística, com particular destaque para a pintura ao ar livre, as quais se encontram disseminadas por muitas coleções públicas e privadas.