02 julho 2019

Acalanto para Implumes


Acalanto para Implumes, do compositor português Álvaro Salazar, por um agrupamento musical não identificado

Hoje vou correr o risco de publicar um post impopular. Trata-se de uma peça de música contemporânea, ou de vanguarda, ou experimental, ou como lhe quiserem chamar, escrita por um dos mais notáveis compositores portugueses dos sécs. XX e XXI, Álvaro Salazar.

Eu tenho uma enorme dificuldade em falar sobre a música que ao longo do séc. XX se fez. No séc. XX, tomaram-se múltiplos caminhos musicais diferentes, como o neorromantismo, o dodecafonismo, a música eletroacústica, as experiências radicais de John Cage, a música tipo "noise", o minimalismo e muitos outros, não necessariamente por esta ordem. Algumas obras seguiram regras rigorosamente matemáticas. Outras romperam com todas as regras e tornaram-se completamente aleatórias. Outras mais procuraram imitar os sons do mundo real. Outras ainda procuraram seguir regras criadas ad hoc pelos seus autores. E por aí adiante, num universo sonoro caótico, que foi o que caracterizou musicalmente o séc. XX e continua a caracterizar o séc. XXI. Seguiram-se tantos caminhos, fizeram-se tantas experiências...

No entanto, ao público em geral quase tudo isto parece igual, uma cacofonia sem pés nem cabeça, simples barulho que não lhe diz nada e que recusa. Quem beneficiou com este caos musical foi a chamada música popular, qualquer que ela seja: tango, rock, pop, pimba, hip-hop ou o que se quiser. O público rejeita liminarmente a música contemporânea e agarra-se a uma música que lhe fale ao coração e não apenas ao cérebro, que tenha pelo menos uma linha melódica ou um ritmo, por exemplo; enfim, que tenha um padrão que as pessoas possam identificar e em que se reconheçam. A música contemporânea, essa, tornou-se extremamente elitista, que só é ouvida por um número ínfimo de pessoas, por mais genial que ela seja, e às vezes é mesmo.

Álvaro Salazar é um compositor nosso contemporâneo, nascido no Porto em 1938, que se dedica a escrever música de vanguarda, ou assim entendida como tal. É um dos maiores autores portugueses do género, a par de Jorge Peixinho, Emanuel Nunes, Cândido Lima e outros. Para ajudar (ou não) a compreender a peça que aqui proponho ouvir, permito-me reproduzir algumas afirmações suas, que se encontram na página que lhe é dedicada no portal do Centro de Investigação & Informação da Música Portuguesa. Passo a transcrever palavras de Álvaro Salazar:
«...desde sempre considerei a música, para além de uma via profissional, uma forma de estar no mundo e de tentar compreendê-lo. A música não é um mero tricot mental, uma actividade desligada do todo onde arte, ciência, história, filosofia e política dialogam, interagem e se completam.»

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