Hino do Minho ou Hino da Maria da Fonte
Hino do Minho ou Hino da Maria da Fonte, por Vitorino, com música de Angelo Frondoni e letra de origem popular
O Hino do Minho, mais conhecido como Hino da Maria da Fonte, é o segundo hino mais importante de Portugal, logo a seguir ao Hino Nacional. É tocado em cerimónias oficiais, encontrando-se a sua execução regulamentada pelo Decreto-Lei N.º 331/80, de 28 de agosto. Segundo este diploma, o Hino da Maria da Fonte deve ser tocado por uma banda de música ou um terno de corneteiros (clarins), quando uma guarda de honra prestar continência a pé firme às seguintes personalidades: Presidente da Assembleia da República, Primeiro-ministro, Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Presidente do Supremo Tribunal Militar, Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e Chefes dos Estados-Maiores da Armada, do Exército e da Força Aérea, Ministros e Secretários e Subsecretários de Estado. Só durante uma continência a pé firme prestada ao Presidente da República e aos chefes de estado estrangeiros em visita oficial, é que o Hino Nacional deve ser tocado.
A música do Hino do Minho, ou da Maria da Fonte, é da autoria de Angelo Frondoni (1812–1891), um músico italiano que se radicou em Portugal e faleceu em Lisboa. A letra original do hino é de Paulo Midosi Júnior (1821–1888), que por acaso também era de ascendência italiana e que escreveu vários libretos para operetas compostas por Angelo Frondoni. Além da letra original, muitas outras letras se adaptaram à mesma música, umas anónimas e outras não, em função da evolução dos acontecimentos políticos que foram ocorrendo durante o turbulento século XIX português.
Passo a transcrever um trecho do Volume II do Cancioneiro de Musicas Populares contendo Letra e Musica de Canções, serenatas, chulas, danças, descantes, cantigas dos campos e das ruas, fados, romances, hymnos nacionaes, cantos patrioticos, canticos religiosos de origem popular, canticos liturgicos popularisados, canções politicas, cantilenas, cantos maritimos, etc. e cançonetas estrangeiras vulgarisadas em Portugal, por Cesar das Neves e Gualdino de Campos, publicado em 1895 no Porto.
HYMNO DO MINHO
Baqueou a tyrannia,(...)
Nobre povo, és vencedor.
Generoso, ousado e livre,
Dêmos gloria ao teu valor.
Eia, ávante, portuguezes,
Eia, ávante! Não temer!
Pela Santa liberdade
Triumphar ou perecer!
Algemada era a nação,
Mas é livre ainda uma vez;
Ora, e sempre, é caro á Patria
O heroismo portuguez.
Eia, ávante, etc.
Lá raiou a liberdade,
Que a nação ha de additar!
Gloria ao Minho, que primeiro
O seu grito fez soar.
Eia, ávante, etc.
Segue, oh povo, o bello exemplo
De tamanha heroicidade,
Nunca mais deixes tyrannos
Ameaçar a liberdade.
Eia, ávante, etc.
Fugi, despotas, fugi,
Vós, algozes da nação!
Livre, a Patria vos repulsa!
Terminou a escravidão.
Eia, ávante, etc.
Este hymno foi muito cantado no theatro de S. João, onde, n'aquella epocha, estava em scena um aproposito da revolução do Minho, em que o personagem principal se chamava Maria da Fonte. Foi do theatro que sahiram muitas das estrophes que se cantavam pela rua, e que eram da lavra do actor Abel, e talvez a denominação que deram ao movimento revolucionario da Junta do Porto.
Eis as cantigas das ruas:
Viva a Maria da Fonte,As duas quadras seguintes attribuem-se ao partido miguelista, representado então na guerrilha do padre Casimiro:
Com as pistolas na mão,
Para matar os Cabraes,
Que são falsos á nação.
Eia, ávante, portuguezes,
Eia, ávante, e não temer,
Pela Patria e liberdade
Triumphar até morrer!
Viva a Maria da Fonte,
A cavallo, sem cahir,
Com as pistolas á cinta,
A tocar a reunir.
Eia, ávante, portuguezes,
Eia, ávante, sem temer,
Pela Patria e liberdade
Batalhar até morrer.
Temos um rei estrangeiro,
Estrangeirada facção,
A rainha estrangeirada,
Só portugueza a nação!
Leva ávante, portuguezes,
Leva ávante d'uma vez,
Nós não queremos que governe
Senão um rei portuguez!
[A "rainha estrangeirada" acima referida é D. Maria II, que foi casada com um alemão, D. Fernando de Saxe-Coburgo-Gotha. O próprio coração de D. Maria II encontra-se na Alemanha, conservado em formol num vaso de cristal, na cripta da igreja de S. Miguel no centro histórico de Munique, que é o panteão da casa real da Baviera.]
A lettra que se segue é coimbrã; n'ella transparece o vigor e o enthusiasmo do nobre patriotismo da mocidade academica d'aquella epocha:
Cáia um throno, cáia um rei,Tendo entrado no Porto o general Povoas, organisou-se no dia 22 de fevereiro de 1847 um espectaculo de gala no theatro de S. João, em que se cantou o hymno com a seguinte lettra:
Onde impéra a tyrannia,
Mas d'um povo a liberdade
Não se perca nem um dia!
Eia, ávante, portuguezes,
Eia, ávante, e não temer,
Pela Patria e liberdade
Triumphar até morrer.
Fulgiu hontem sobre o Porto1 Povoas tinha sido cercado na serra da Estrella pelos generaes Solla e Lapa; mas de noite escapou-se com os seus por um atalho, ficando logrados os sitiantes. Povoas era miguelista, mas prestou serviço á Patuleia.
Um meteóro de gloria:
Chegou Povoas, e com elle
Chegou o deus da victoria.
Armas! ferro! guerra! guerra!
Tremulem nossos pendões.
Contra a vil horda de escravos
Marchae, livres, batalhões.
Atravez d'eternos gêlos
Passou com sabia ousadia 1.
Deus proteje o nobre arrojo
Contra a feroz tyrannia.
Armas! ferro!, etc.
Uma côrte corrompida
Fascina o sceptro real;
Escravisar em vão querendo
Este nosso Portugal.
Armas! ferro!, etc.
Opprimir tentam o povo
Com perversa atrocidade?
Querem sangue? haja sangue!
Regue sangue a liberdade.
Armas! ferro!, etc.
Povoas, Antas, Guedes, Cesar,
Almargem, Sá da Bandeira,
Vão cingir d'immortaes louros
A mocidade guerreira.
Armas! ferro!, etc.
Ora sus! ergue-te oh povo,
Qual gigante ingente e forte,
Eis o teu grito de guerra:
Ou liberdade ou a morte.
Armas! ferro!, etc.
D'entre os numerosos versos que o povo applicava ao hymno do Minho, durante a revolução da Patuleia, recordamos os seguintes, por terem directa ou figuradamente descripto os factos que se iam succedendo:
O Saldanha já mandou,2 O general Saldanha era cabralista; porém depois foi elle que derrubou aquelle governo.
Suas tropas retirar,
Porque tem medo da fome
E a palha está-se a acabar 2.
Já lá vae para Hespanha,
A divisão do Casal 3;
Deus a leve em boa hora,
Que não volte a Portugal.
A rainha não podendo
Vencer os nossos guerreiros,
Foi pedir, oh que vergonha!
Protecção aos estrangeiros 4.
3 General que em dezembro de 1847 atacou o Porto e em seguida retirou-se para Hespanha.
4 Allude á intervenção hespanhola e ingleza.
Deu origem a muitos versos populares a revolução do Minho, cuja lenda é a seguinte:
Os excessivos tributos com que o governo do marquez de Thomar, Antonio Bernardo da Costa Cabral, havia sobrecarregado o povo, traziam este excitado a ponto de que o menor pretexto, serviria a uma explosão hostil. Foi o caso, que, tendo ordenado o governo não fazerem mais exhumações dentro dos templos, como era de uso, encontrou esta lei grande opposição, principalmente nas aldeias, onde não havia cemiterios. Succedeu então na Povoa de Lanhoso ter fallecido uma mulher, e o regedor, no cumprimento da lei, não consentiu que se enterrasse na egreja; porém, umas sete mulheres que tinham acompanhado o cadaver, teimaram em fazer alli a exhumação, resultando grande lucta com a auctoridade. Salientou-se d'entre aquellas, uma chamada Maria Angelina, do logar da Fonte, ou natural de Fonte Arcada, que mandou tocar o sino a rebate com todo o vigor. N'um instante, alarmou-se toda a freguezia, e o regedor teve de fugir ás unhas das matronas, que enterraram o cadaver na egreja:
As sete mulheres do Minho,Findo o enterro, o povo amotinado percorre as estradas e praças, armado dos instrumentos agricolas, que mais á mão encontrou, clamando pela revogação da lei e dos tributos; a Maria lá marchava na frente, enthusiasmada e enthusiasmando, até que teve de entregar o commando ao celebre padre Casimiro 1, de quem o povo cantou:
Mulheres de grande valor,
Armadas de fuso e roca,
Correram o regedor!
Viva o padre Casimiro,1 O padre Casimiro José Vieira falleceu, na casa da Alegria, em Felgueiras, a 30 de junho do corrente anno de 1895, com 78 annos de idade, pobre e abandonado. Aos 29 annos tomou parte importante na revolta do Minho, querendo encaminhar a revolução para o seu ideal absolutista. Era muito estimado pelo povo, que o acclamou Defensor das Cinco Chagas, e general commandante das forças populares do Minho e Traz-os-Montes. Em 1847, por diploma de 7 d'abril, foi nomeado pelo logar-tenente de D. Miguel I, n'este reino, (dr. Candido Rodrigues Alves de Figueiredo Lima), Commandante geral de todas as forças populares ao norte do Minho, com honras de brigadeiro.
Que é mesmo um anjo do céo:
Pois traz sempre o crucifixo
No forro do seu chapéo.
A Maria tambem teve a sua glorificação:
Essa mulher lá do Minho,(...)
Que da fouce fez espada,
Ha de ter na lusa historia
Uma pagina dourada.
César das Neves e Gualdino de Campos, Cancioneiro de Musicas Populares, Volume II, Porto, 1895
Comentários: 1
O hino da Maria da Fonte é sobejamente conhecido e as suas explicações complementaram-no muitíssimo bem !!!
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