03 maio 2020

O que se odeia no índio

O que se odeia no índio
não é apenas o ocupado espaço.
O que se odeia no índio
é o puro animal que nele habita,
é a sua cor em bronze arquitetada.
A precisão com que a flecha voa
e abate a caça; o gesto largo
com que abraça o rio; o gosto de
afagar as penas e tecer o cocar;
O que se odeia no índio
é o andar sem ruído; a presteza
segura de cada movimento; a eugenia
nítida do corpo erguido
contra a luz do sol.
O que se odeia no índio é o sol.
A árvore se odeia no índio.
O rio se odeia no índio.
O corpo a corpo com a vida
se odeia no índio.
O que se odeia no índio
é a permanência da infância.
E a liberdade aberta
se odeia no índio.

Reynaldo Jardim (1926–2011), poeta e jornalista brasileiro



Índio brasileiro de etnia Kuikuro (Foto: Karla Freitas)

Comentários: 3

Blogger Maria João Brito de Sousa escreveu...

E tudo isso é o que me leva a amá-lo e a respeitá-lo ainda mais...

Abraço!

04 maio, 2020 09:40  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Prezada Maria João,
Tenho aqui mesmo à minha frente, devidamente encaixilhado e dependurado na parede, um belo cocar de penas dos índios Pataxó, que vivem nos estados da Baía e de Minas Gerais. Basta-me levantar a cabeça para vê-lo. Isso leva-me a lembrar-me frequentemente dos índios e a evocá-los de vez em quando aqui no blog.

Os índios resistem há mais de cinco séculos a toda a espécie de perseguições, genocídio e discriminação. Desde que Bolsonaro é presidente do Brasil, então, a sua situação agravou-se consideravelmente. O aparecimento da pandemia do novo coronavírus, ainda por cima, veio piorar ainda mais as coisas. Os índios devem ser apoiados nas suas causas, que também são nossas, ou deviam ser.

05 maio, 2020 01:59  
Blogger Maria João Brito de Sousa escreveu...

Disso não tenho a menor dúvida, caro Fernando.

Tive, no entanto, de deixar de acompanhar os "updates" das causas que circulam online. A pouquíssima acuidade visual que me resta, obriga-me a dosear a conta-gotas as minhas leituras e. A alternativa seria deixar de escrever e isso, para mim, seria perder o sentido da vida.

05 maio, 2020 10:05  

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