14 junho 2021

Publicidade enganosa


Anúncio de imprensa, publicado por volta de 1970, mais ano, menos ano, em jornais e revistas portugueses. Este anúncio sugere que os cigarros da marca publicitada eram tão inofensivos, que até os médicos os fumavam

Comentários: 6

Blogger Maria João Brito de Sousa escreveu...

PORTO, SAGRES, KAYAK OU PORTUGUÊS SUAVE, QUASE TODOS OS MÉDICOS QUE CONHECI - E CONHECI MUITOS - FUMAVAM, NA DÉCADA DE 70.

ABRAÇO!

(PERDOE-ME AS MAIÚSCULAS MAS SEMPRE AJUDAM UM POUCO QUEM, COMO EU, TEM UMA ACUIDADE VISUAL MUITO REDUZIDA)

14 junho, 2021 08:24  
Blogger Valdemar Silva escreveu...

Este anúncio do tabaco é/era criminoso, também havia outro a anunciar o "Kart dá quilómetros de prazer"
E o que dizer da publicidade à Marlboro nos EUA, quando os anúncios eram feitos por bebés!!!
'Gee, Mammy, you sure enjoy your Marlboro' ou 'Gee, Dad, you always get he best of everyhing ...even Marlboro.

Pois, os médicos também fumam e até durante as consultas arranjam um 'venho já', regressando a tresandar à cigarrada. Conheço um caso de um médico de pneumologia!.

Eu fumei mais de 50 anos, desde criança, agora com a DPOC os problemas respiratórios são muito graves chegando ao ponto de cansar-me a lavar os dentes e a comer. Canso-me a comer!!!

Abraço
Valdemar Queiroz

14 junho, 2021 17:34  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Cara Maria João,

Pode escrever em maiúsculas ou como quiser. Só não pode escrever em carateres chineses, porque não os entendo.

Em 1970, quase todos os médicos eram homens e quase todos os homens fumavam. Não é de espantar, por isso, que quase todos os médicos fumassem. A mentalidade da época era tal, que um homem que não fumasse poderia ver a sua própria masculinidade posta em causa!

Mas em 1970 já havia uma consciência muito aguda de que os cigarros faziam mal à saúde. E muitos médicos já se sentiam desconfortáveis com o vício que os mantinha presos aos cigarros. Apesar de serem fumadores, muitos deles já confidenciavam: «Que autoridade moral tenho eu para recomendar a um doente que deixe de fumar, se eu próprio sou fumador?»

A indústria dos cigarros também tinha clara consciência do mal que os seus produtos faziam. A prova disso é que, em 1970, a indústria multiplicava as marcas de cigarros com filtro, de que a marca Porto é apenas um exemplo, e até lançou novas marcas que tinham filtros de carvão, supostamente mais eficazes na eliminação do alcatrão. Foi o caso das marcas de cigarros Estoril e Sintra, assim como das suas versões mais curtas, Tamariz e Monserrate. Poucos anos depois, descobriu-se que as partículas de carvão libertadas pelo filtro eram elas próprias potencialmente cancerígenas, os filtros de carvão foram proibidos e as marcas Estoril, Sintra, Tamariz, Monserrate e outras foram retiradas do mercado.


Caro Valdemar Queiroz,

Eu não queria estar na sua pele. Dizer-lhe que estou solidário consigo é um fraco consolo. Vou dizer-lhe o quê, então?

Tive uma tia que fumou durante décadas, desde quando nenhuma mulher fumava. Ela queria afirmar-se perante a sociedade como uma mulher livre e independente, que em nada ficava a dever aos homens, e começou a fumar como eles. Foi uma mulher verdadeiramente extraordinária, de facto, mas escusava de fumar. Os últimos anos da sua vida foram uma tortura constante, em permanente falta de ar. Julgo que sofria do mesmo mal que o Valdemar. Era arrepiante vê-la a arfar, a arfar, querendo respirar e quase não podendo. Ficava completamente exausta só por se deslocar da sala para a casa de banho. Teve uma péssima qualidade de vida por causa do maldito tabaco.

Eu deixei de fumar em 1979 e nunca mais pus um cigarro na boca, aceso ou apagado. Bendigo a hora em que decidi fazê-lo, apesar de ter sofrido com a privação do tabaco durante mais de seis meses. Eu estava completamente viciado e o organismo reclamava-me a sua dose de nicotina, 24 horas por dia e 7 dias por semana. Se alguém quiser deixar de fumar, recorra a todas as ajudas possíveis e imaginárias, porque a síndrome da privação é uma coisa medonha, de fazer trepar pelas paredes. A nicotina é uma droga que escraviza.

14 junho, 2021 22:35  
Blogger Ricardo Santos escreveu...

Fumei até Maio de 1985, e na altura ia fazer 32 anos.
A marca Porto fumei durante algum tempo :) !
Felizmente que me livrei do vício, que não faz nada bem à nossa saúde e não remeida piscologicamente, absolutamente nada !

14 junho, 2021 23:59  
Blogger Valdemar Silva escreveu...

Caro Fernando Ribeiro
Isto do vicio de fumar cigarros é terrível, ainda por cima não se considerar um "vicio anti social". Realmente nunca ninguém foi preso por roubar pra comprar cigarros, e o vicio é abrangente a todas as classes sociais só se diferenciando na marca/preço do maço de cigarros.
Eu comecei a fumar em criança 14-15 anos e acabei aos 65 já muito debilitado e uns dias antes de ir quase em coma para o Hospital Amadora-Sintra.
Já andava com muitas dificuldades, mas continuava a fumar e deixei de repente numa circunstância nitidamente psicológica.
Habitualmente, e já com dificuldades de locomoção, visitava o meu filho a viver nos Países Baixos e tínhamos estado a falar ao telefone na impossibilidade de os visitar daquela vez.
Depois teria havido conversa com minha nora relatando o meu estado de saúde e o meu neto compreendeu a conversa. Entretanto a mãe do meu filho seguiu sozinha e quando lá chegou o meu neto não me viu e perguntou se eu tinha morrido.
E foi quando o meu filho me telefonou a contar a admiração/constatação do meu neto que eu deixei de fumar nesse momento e nunca mais fumei: um maço e meio ainda estão numa mesa desde esse dia.
Dois dias depois fui para o Hospital e estive internado quase um mês. Com acompanhamento de consultas de pneumologia há mais de dez anos tenho feito os tratamentos e por mais três vezes tive recaídas voltando de ser internado por períodos de quinze dias.
E cá vou indo acompanhado do inseparável oxigênio sem poder fazer grandes saídas de casa.

Abraço
Valdemar Queiroz

15 junho, 2021 00:34  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Caro Ricardo Santos,

Fumei muitas marcas de cigarros, mas não Porto. A marca que mais fumei foi SG Gigante. De todas as marcas que fumei, a que mais me agradou foi a 555, que fumei durante alguns meses em Angola, quando cumpria o serviço militar e estava colocado na fronteira. A marca 555 era inglesa, mas os cigarros que eu comprava eram fabricados sob licença na República do Zaire, atual República Democrática do Congo. Eu comprava-os aos contrabandistas, que os traziam do país do Mobutu, porque os cigarros angolanos não me satisfaziam, de maneira nenhuma, apesar de haver uma grande profusão de marcas (AC, Belmar, Capri, Set Internacional, etc. etc. etc.).


Caro Valdemar Queiroz,

Fico-lhe muito agradecido e contristado pelo que me conta. Não consigo imaginar como deve sofrer. O apoio moral que eu lhe poderei dar não será de muita utilidade, mas vou fazer o quê? Com toda a sinceridade, desejo-lhe tudo de bom.

Eu deixei de fumar às 16 horas do dia 1 de julho de 1979. Nessa ocasião queimei o último cigarro (SG Gigante) e, por coincidência, o último fósforo que tinha. Seguiu-se uma odisseia que nunca imaginei que pudesse ser como foi.

À noite deitei-me já com uma grande ânsia de fumar e quase não dormi. Passei a noite a dar voltas na cama, ao mesmo tempo que chupava em seco. O dia seguinte foi um dos mais miseráveis de toda a minha vida. A vontade de fumar era avassaladora, o estômago revolvia-se (quase vomitei) e a minha cabeça estava mergulhada numa confusão absoluta. No mais completo sentido do termo, eu não sabia de que terra era. Não sabia mesmo. Ainda assim, resisti. Como foi isto possível?

Foi possível porque ao mesmo tempo que eu me sentia horrivelmente mal, reparei que estava a pigarrear, coisa que eu não costumava fazer. Depositei um pouco de saliva num lenço e vi que, em vez de uma saliva límpida, incolor e com bolhinhas, como são todas as salivas, eu tinha no lenço um fluido baço, acinzentado e de aspeto repugnante. Os meus pulmões tinham iniciado um processo de limpeza do alcatrão que neles se tinha depositado. Pensei: «Olha a porcaria que eu tenho nos pulmões! Que nojo!» A minha decisão de deixar de fumar reforçou-se, pois eu tinha que me libertar daquele sarro, custasse o que custasse.

O segundo dia foi um dia de sofrimento igual ao anterior mas, simultaneamente, de encantamento e de esperança no futuro. De manhã levantei-me cheio de sono, porque quase não dormira, mas ao mesmo tempo senti-me com uma força e um vigor, como não me tinha sentido há muitos anos. Eu sentia-me com uma energia absolutamente transbordante. Sentia-me capaz de dar uma tareia ao campeão do mundo de boxe. Sentia-me capaz de bater o recorde olímpico da maratona. Sentia-me invencível.

Mas esta sensação de energia não era tudo. Tão importante ou mais do ela, foi o facto de eu ter recuperado os sabores e cheiros da minha infância. O pão fresco com manteiga sabia-me a pão fresco com manteiga, e não a pão com manteiga e tabaco. A carne sabia-me a carne, e não a carne e tabaco. O peixe sabia-me a peixe, e não a peixe e tabaco. As minhas papilas gustativas deixaram de estar saturadas de tabaco e passaram a dar-me os sabores que as comidas verdadeiramente tinham.

O mesmo se passou com a minha pituitária. As rosas cheiravam a rosas, e não a rosas e tabaco. Os pinheiros cheiravam a pinheiro, e não a pinheiro e tabaco. A maresia cheirava a maresia, e não a maresia e tabaco. Senti-me de volta à minha infância, com a energia, os cheiros e os sabores de quando tinha dez anos de idade. Pensei: «Apesar de tudo, vale a pena deixar de fumar. NÃO POSSO VOLTAR ATRÁS!»

Ao fim de uma semana, as reações físicas (enjoos e confusão mental) passaram. Ao fim de três meses, a vontade inadiável de fumar tornou-se intermitente. Ao fim de seis meses, quase não se fazia sentir. Ao fim de um ano, tive a minha última vontade de fumar, aliás violentíssima, que quase deitou tudo a perder. Foi um ano duríssimo, de que nunca mais me vou esquecer, mas valeu a pena.

16 junho, 2021 02:52  

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