07 novembro 2021

Um poema sem sentido


O escritor inglês Lewis Carrol (1832-1898), autor do famoso livro Alice no País das Maravilhas, gostava muito de inventar palavras. Algumas destas palavras tinham um significado determinado, mas outras não significavam absolutamente nada. Lewis Carrol inventava-as por puro prazer.

No livro Alice do Outro Lado do Espelho, Lewis Carrol escreveu um poema inteiro que tem rima, tem métrica, tem ritmo, mas não quer dizer nada. Ou quererá dizer alguma coisa? É um poema recheado de palavras que não vêm em qualquer dicionário e não têm qualquer significado, mas o conjunto do poema tem uma sequência lógica e parece fazer sentido. O poema, supostamente escrito em inglês, é o seguinte:

JABBERWOCKY

‘Twas brillig, and the slithy toves
Did gyre and gimble in the wabe:
All mimsy were the borogoves,
And the mome raths outgrabe.

“Beware the Jabberwock, my son!
The jaws that bite, the claws that catch!
Beware the Jubjub bird, and shun
The frumious Bandersnatch!”

He took his vorpal sword in hand:
Long time the manxome foe he sought—
So rested he by the Tumtum tree,
And stood awhile in thought.

And, as in uffish thought he stood,
The Jabberwock, with eyes of flame,
Came whiffling through the tulgey wood,
And burbled as it came!

One, two! One, two! And through and through
The vorpal blade went snicker-snack!
He left it dead, and with its head
He went galumphing back.

“And hast thou slain the Jabberwock?
Come to my arms, my beamish boy!
O frabjous day! Callooh! Callay!”
He chortled in his joy.

‘Twas brillig, and the slithy toves
Did gyre and gimble in the wabe:
All mimsy were the borogoves,
And the mome raths outgrabe.

Como é que se traduz um poema destes para português? Será possível uma tal tradução ou será preferível deixar o poema na sua forma original?

Os diversos tradutores do livro decidiram criar eles próprios um poema que lhe possa equivaler. Das várias traduções publicadas, resultaram vários poemas
nonsense em suposto português que são muito diferentes uns dos outros, consoante o talento de cada tradutor. Dos poemas que encontrei na internet, o que me parece mais conseguido é da autoria do brasileiro Augusto de Campos, que é, ele mesmo, um poeta. A sua "tradução" é como segue:

JAGUADARTE

Era briluz. As lesmolisas touvas
roldavam e reviam nos gramilvos.
Estavam mimsicais as pintalouvas,
E os momirratos davam grilvos.

“Foge do Jaguadarte, o que não morre!
Garra que agarra, bocarra que urra!
Foge da ave Fefel, meu filho, e corre
Do frumioso Babassura!”

Ele arrancou sua espada vorpal
e foi atrás do inimigo do Homundo.
Na árvore Tamtam ele afinal
Parou, um dia, sonilundo.

E enquanto estava em sussustada sesta,
Chegou o Jaguadarte, olho de fogo,
Sorrelfiflando através da floresta,
E borbulia um riso louco!

Um dois! Um, dois! Sua espada mavorta
Vai-vem, vem-vai, para trás, para diante!
Cabeça fere, corta e, fera morta,
Ei-lo que volta galunfante.

“Pois então tu mataste o Jaguadarte!
Vem aos meus braços, homenino meu!
Oh, dia fremular! Bravooh! Bravarte!”
Ele se ria jubileu.

Era briluz. As lesmolisas touvas
Roldavam e relviam nos gramilvos.
Estavam mimsicais as pintalouvas,
E os momirratos davam grilvos.


Supercalifragilisticexpialidocious, do filme Mary Poppins, de Robert Stevenson, com Julie AndrewsDick Van Dyke e The Pearlie Chorus

Comentários: 2

Blogger Maria João Brito de Sousa escreveu...

Com ou sem "nonsense words", o poema narra um feito "heróico" perfeitamente compreensível no seu todo :)

Deliciei-me com ele, bem como com a feliz "tradução" de Augusto de Campos.

Abraço, Fernando!

08 novembro, 2021 12:26  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Realmente, há poemas que são de tal maneira esotéricos que este, em comparação, é de uma cristalina clareza.

Um grande abraço, Maria João

11 novembro, 2021 02:42  

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