30 junho 2025
27 junho 2025
Alright, OK, You Win
24 junho 2025
Moura Girão
(Clicar na imagem para ampliá-la)
(Clicar na imagem para ampliá-la)
(Clicar na imagem para ampliá-la)
O pintor naturalista português Moura Girão confessou um dia que gostava tanto de animais, que se sentia incapaz de comer uma asa de frango ou arroz de cabidela. Não duvidaremos desta afirmação nem por um momento, se virmos a quantidade de obras suas que representam, sobretudo, galos, galinhas e pintainhos. Moura Girão também pintou outros animais e outros temas, mas os galos e outros galináceos avultam na sua obra de forma claramente destacada.
José Maria de Sousa Moura Girão nasceu em Lisboa em 1840, fez parte do chamado Grupo do Leão, que Columbano Bordalo Pinheiro retratou num quadro famoso que está no Museu do Chiado, trabalhou durante uma boa parte da sua vida como restaurador no Museu Nacional de Arte Antiga e faleceu, também em Lisboa, em 1916.
19 junho 2025
Rapsódia Sueca N.º 1 de Alfvén
A Rapsódia Sueca N.º 1, de Hugo Alfvén, foi por este compositor chamada Midsommarvaka, palavra composta por Midsommar (="meio do verão") e vaka (="vigília"). Em português, esta palavra poderá ser traduzida de uma forma muito livre por "Noite de São João", pois ela se refere às festas do solstício de verão, que são de origem pagã e têm lugar um pouco por toda a Europa por alturas do dia de São João.
Várias considerações se poderiam fazer a propósito destas festas, assim na Suécia como em Portugal e na Europa em geral, a começar pela sua designação. A palavra sueca para o solstício de verão, que ocorre em 21 ou 22 de junho, é midsommar (em inglês midsummer), que quer dizer "meio do verão", mas o calendário diz-nos que no hemisfério norte o solstício de junho corresponde ao início do verão e não ao seu meio.
No norte da Europa há uma enorme diferença entre o verão e o inverno em termos de duração dos dias e das noites: enquanto no solstício de inverno a noite é longuíssima e o dia curtíssimo, no de verão sucede o contrário. Nas regiões situadas a norte do Círculo Polar Ártico, então, brilha o sol à meia-noite no solstício de verão, enquanto no de inverno o sol nem chega a nascer. Em resultado desta enorme variação na duração dos dias e das noites, considerava-se que o verão era a estação do ano que tinha as noites mais curtas e os dias mais compridos: começava em 1 de maio, atingia o seu apogeu no solstício e acabava no fim de julho.
Quando a vida dos povos europeus estava estreitamente ligada à Natureza, a sucessão das estações do ano e a sua influência na vida das pessoas tinham uma importância transcendente. Como eram pagãs, as pessoas acreditavam que era dos bons ou dos maus humores dos deuses e dos espíritos que dependiam as boas ou as más colheitas, a multiplicação ou não das cabeças de gado, as fúrias ou as calmarias dos mares que lhes davam o peixe, a saúde ou as doenças dos filhos que geravam, etc. Por isso, as pessoas procuravam afastar os espíritos maléficos e cair nas boas graças das divindades benéficas, recorrendo à magia, à superstição, às rezas, às oferendas, aos sacrifícios, à feitiçaria, etc. Os momentos mais propícios a tais práticas eram, sobretudo, os solstícios, tanto o do inverno, que acontece em dezembro, como o do verão, que ocorre em junho, porque são marcas reconhecíveis de uma viragem na sucessão das estações do ano e portanto na evolução da própria vida.
Reconhecendo a importância que tais crenças e tais práticas representavam para os povos, a Igreja procurou incorporá-las na sua própria liturgia. Em vez de as combater, a Igreja cristianizou as festividade pagãs dos solstícios, associando o solstício de inverno ao nascimento de Cristo, o Salvador, que é celebrado em 25 de dezembro, e o solstício de verão a São João Batista, o santo que anunciou a vinda próxima de Cristo e que é evocado no dia 24 de junho.
Enquanto a cristianização do solstício de inverno foi quase total, através das festividades tradicionais do Natal, na cristianização do solstício de verão muitas das antigas práticas e tradições pagãs resistiram até aos nossos dias, talvez porque a Igreja as tenha associado ao santo errado. São João Batista foi um santo austero, que vivia no deserto, se vestia de peles de animais, fazia jejuns e se alimentava de gafanhotos. Um santo assim dificilmente poderia ser associado a um tempo de sol, de calor e de esperança em colheitas abundantes. São João Batista foi tudo menos um santo alegre, rapioqueiro e até um pouco maroto, que é como a tradição o representa nas festividades do solstício de verão.
São João p’ra ver as moças(Quadra popular portuguesa)
Fez uma fonte de prata;
As moças não vão a ela,
São João todo se mata.
A importância do solstício do verão é tão grande para os povos europeus, que quase todos eles o celebram. Ainda por cima, existem claras afinidades nas celebrações dos diversos povos do continente, que foram certamente fruto das muitas invasões e conquistas que a Europa sofreu ao longo dos séculos e dos milénios. Uma das afinidades mais evidentes na celebração do solstício de verão é a do uso do fogo. Aqui no Porto, por exemplo, é verdade que já ninguém salta a fogueira na noite de São João, como sucedia no passado, mas são lançados para o ar milhares de balões coloridos, impulsionados por uma mecha a arder. Paralelamente, na Finlândia, que fica no extremo oposto da Europa, acendem-se grandes fogueiras nas margens dos incontáveis lagos que existem no país. Isto anda tudo ligado, como se vê. Todos são europeus.
Na Suécia, as festividades do solstício de verão também tinham lugar na noite que antecede o dia de São João, tal como sucede em Portugal. Na década de 50 do século passado, porém, resolveram eliminar o feriado, passando as festividades para a noite de sexta-feira para sábado que estiver mais próxima do São João. Por isso, este ano, na Suécia, o Midsommarvaka calha na noite do dia 20 para 21 de junho.
15 junho 2025
13 junho 2025
Vila Flor
(Clicar na imagem para ampliá-la)
Vila Flor, apesar de ser sede de concelho, é uma vila pequena, onde quase tudo está praticamente ao alcance da mão. Estendemos um braço e tocamos na chamada "Fonte Romana", que de facto não é romana, porque no tempo dos romanos Vila Flor nem sequer existia. Voltamos a estender um braço e tocamos no Arco de D. Dinis, que é um arco ogival de pedra, erguido no ar quase sem sustentação e é o que resta da antiga muralha da vila, mandada construir pelo Rei-Lavrador. Estendemos outra vez um braço e tocamos no Museu Berta Cabral, que nunca cheguei a visitar e sobre o qual, por isso, não estou em condições de opinar. De novo estendemos um braço e tocamos na Igreja Matriz, que só por si justifica plenamente uma deslocação até Vila Flor.
(Clicar na imagem para ampliá-la)
A Igreja Matriz de Vila Flor é dedicada a São Bartolomeu e foi construída no séc. XVIII, em substituição de uma outra que anteriormente teria existido no mesmo local e que se teria desfeito em ruínas. O melhor que a igreja atual tem para mostrar não está no seu interior, mas sim cá fora, à vista de toda a gente. É verdade que lá dentro há altares com talha dourada barroca de excelente qualidade artística. Porém, o que realmente me enche a alma na Igreja Matriz de Vila Flor é o seu exterior, com particular destaque para a fachada principal. Dizem os entendidos que a igreja é barroca e a sua fachada tem elementos maneiristas. Até poderia ser ao contrário ou não ser nada disto, porque o estilo é o que menos importa. O que importa é a grande e original beleza que esta fachada tem. Aposto que em nenhuma outra parte do mundo encontramos uma fachada assim. Uma vez vista, nunca mais se esquece.
(Clicar na imagem para ampliá-la)
A chamada "Fonte Romana" de Vila Flor seria uma fonte banal se não lhe estivesse associado um mirante do séc. XVI, com uma abóbada de tijolo assente em colunelos de pedra. Com que finalidade terão feito este mirante, se a vista que se tem dele não é ampla? A mim, parece-me que este mirante foi feito para que as pessoas tivessem uma sombra que as abrigasse da torreira do sol, quando levavam o seu gado à fonte e aguardavam que ele matasse a sede. Vila Flor fica no coração da Terra Quente transmontana e os seus verões são verdadeiramente sufocantes. Qualquer sombra, por mais pequena que seja, é sempre bem-vinda em Vila Flor.
(Clicar na imagem para ampliá-la)
Como Vila Flor fica na Terra Quente, a agricultura que à sua volta se pratica é do tipo mediterrânico, com amendoais, olivais, vinhedos, pomares, etc. Basta subir ao santuário de Nossa Senhora da Assunção, junto a Vilas Boas, ou descer ao fertilíssimo Vale da Vilariça, para nos encontrarmos rodeados por uma paisagem que é completamente diferente da da vizinha Terra Fria, caracterizada por castanheiros e campos de centeio. Em Vila Flor, quase poderíamos dizer que nos encontramos em pleno Algarve, em vez de Trás-os-Montes.
(Clicar na imagem para ampliá-la)
09 junho 2025
Alimento il mio proprio tormento
05 junho 2025
Acabamos sempre por esquecer tudo
Acabamos sempre por esquecer tudo.
O tempo gera a traição do abandono
e a memória não passa de disfarce.
O que fomos
o que vimos
o que fizemos
o que nos fizeram,
esquecemos tudo.
Acabamos sempre por esquecer tudo.
Esvaem-se os anos e os corpos
na escuridão que nos persegue.
Mantemos os olhos maquinalmente abertos
mas já nada vemos
do que passou
do que foi.
Já nada persiste.
Restam, talvez, algumas sombras disformes
um ou outro eco mecânico
palavras despidas
o sonho
o pesadelo
um nevoeiro acre e sem fundo…
Esquecemos tudo
nas oportunistas mãos do vácuo,
irmão incestuoso da morte.
Como foi possível esquecer-te, João Cabral?
E tu, Miguel,
e tu, Lourenço,
e tu, povo angolano,
e tu, soldado da minha guerra?!
Os vermes parasitam nossas recordações
cantando hinos de decomposição.
Onde estão o medo, os soluços, o desespero, a[raiva?!Onde estão os mortos, os vivos, as vítimas, os[algozes?!
Quase não acredito no que já esqueci.
Mário Brochado Coelho (1939–2023) in Cinco passos ao sol, Edições Afrontamento, Porto, 1991