19 junho 2018

Não digas nada


Poderemos dizer que Mário Cesariny plagiou Fernando Pessoa? A semelhança entre o poema de Cesariny, que publiquei no post anterior deste blog, e o poema seguinte de Fernando Pessoa é tão evidente que chega a ser chocante.

NÃO: NÃO DIGAS NADA!

Não: não digas nada!
Supor o que dirá
A tua boca velada
É ouvi-lo já.

É ouvi-lo melhor
Do que o dirias.
O que és não vem à flor
Das frases e dos dias.

És melhor do que tu.
Não digas nada; sê!
Graça do corpo nu
Que invisível se vê.
5/6-2-1931, Fernando Pessoa (1888–1935)


Mais tarde Fernando Pessoa escreveu o seguinte poema, que tem um título quase igual.

NÃO DIGAS NADA!

Não digas nada!
Não, nem a verdade!
Há tanta suavidade
Em nada se dizer
E tudo se entender —
Tudo metade
De sentir e de ver…
Não digas nada!
Deixa esquecer.

Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda esta viagem
Até onde quis
Ser quem me agrada…
Mas ali fui feliz…
Não digas nada.

23-8-1934, Fernando Pessoa (1888–1935)


(Foto de autor desconhecido)

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