Caiu-me na minha catulinha
(Foto de autor desconhecido)
“
De uma vez andava uma galinha a esgravatar no chão, e caiu-lhe um bocado de caliça em cima da cabeça; a galinha espantada botou a fugir, e encontrou um galo que lhe perguntou:”
— Para onde vais a fugir, comadre galinha?
Ela respondeu:
— Caiu-me na minha catulinha! É o céu que está a cair aos pedaços.
O galo pôs-se também a fugir com a galinha; encontraram um porco, que andava à landra, e assim que os viu, perguntou:
— Para onde ides a fugir tão asinha?
— Caiu-me na minha catulinha. Está o céu a cair aos pedaços.
O porco também foi com eles; encontraram um gato, que lhes perguntou:
— Para onde ides a fugir tão asinha?
Respondeu a galinha:
- Caiu-me na minha catulinha! Está o céu a vir abaixo aos pedaços.
O gato foi também a fugir com eles todos; e assim foram encontrando um pato, uma raposa, uma cabra, uma ovelha e iam todos juntos por esse mundo fora. Até que encontraram um cão, que lhes perguntou:
— Para onde é que vai toda esta romaria?
Respondeu a galinha:
— É o céu que está caindo aos pedaços. Caiu-me na minha catulinha.
Todos os outros animais diziam que nada tinham visto, mas que era a galinha que lho dizia. Disse então o cão:
— Não vão mais para diante, e fiquem aqui debaixo da cama da minha velha, até ver em que as cousas param.
Lá ficaram. A velha, de noite, coçava-se com as pulgas, e a cama rangia. Os animais com medo de que caísse o céu aos pedaços, faziam muita bulha:
A galinha cacarejava,
e o galo cantava,
e o porco roncava,
e o gato miava,
e o pato grasnava,
a raposa regougava,
a cabra berrava,
a ovelha balava,
o cão ladrava,
e a velha dizia:
— Mal hajas tu cão,
Que não agradeces
O bem que te fão.
Conto tradicional recolhido no Porto, in Contos Tradicionais do Povo Português, por Teófilo Braga
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