26 maio 2024

Dez anos de saudade



MÃE
Mãe:
Que desgraça na vida aconteceu,
Que ficaste insensível e gelada?
Que todo o teu perfil se endureceu
Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa
Cansada de palavras e ternura,
Assim tu me pareces no teu leito.
Presença cinzelada em pedra dura,
que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti — não me respondes.
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio.
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes
Por detrás do terror deste vazio.

Mãe:
Abre os olhos ao menos, diz que sim!
Diz que me vês ainda, que me queres.
Que és a eterna mulher entre as mulheres.
Que nem a morte te afastou de mim!

Miguel Torga (1907–1995)

Comentários: 3

Blogger Isabel escreveu...

Lindo poema.

A minha, faleceu há pouco mais de um ano. As saudades são diárias.

Boa semana:))

26 maio, 2024 22:28  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Obrigado, Isabel. A minha mãe era uma guerreira, dotada de uma fibra que eu não tenho. Nós, homens. julgamo-nos uns valentões, mas em comparação não passamos de uns mariquinhas.

29 maio, 2024 03:24  
Blogger Isabel escreveu...

Ah!Ah!Ah!
Temos dias...homens e mulheres!
Boa semana:))

29 maio, 2024 15:13  

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