Fachada lateral norte da Sé Catedral da Guarda (Foto: Antonio Martins)
Dizia-se que a cidade da Guarda era a cidade dos cinco efes: Forte, Farta, Fria, Fiel e... Feia.
Feia, a Guarda?! Lavro o meu protesto! Eu gosto muito da Guarda e não posso aceitar que alguém diga que ela é feia. A Guarda é a cidade dos cinco efes, sim, mas estes são: Forte, Farta, Fria, Fiel e FORMOSA!
«Formosa, a Guarda?», poderão alguns objetar por sua vez. «Como poderá ser formosa uma cidade que é talhada no duro e cinzento granito? Ainda se fosse em calcário ou outra pedra branda e branca…» E eu respondo: «Visitem a Sé da Guarda e depois venham dizer-me se pode ser considerada feia uma cidade que tem uma tal catedral.» Note-se que é uma catedral talhada no duro granito, como o resto da cidade. Muito trabalho ela deve ter dado aos seus pedreiros!
A diocese da Guarda foi criada na transição do séc. XII para o séc. XIII pelo papa Inocêncio III, a pedido do rei de Portugal D. Sancho I, em substituição da diocese de Egitânia, com sede na atual vila histórica de Idanha-a-Velha. Por esta razão é que os naturais da Guarda são chamados egitanienses, à semelhança dos naturais de Idanha-a-Velha e também dos de Idanha-a-Nova.
A atual Sé Catedral da Guarda começou a ser construída nos finais do séc. XIV, mas só ficou concluída no séc. XVI. É, portanto, uma catedral gótica, mas com uma mistura de diversas variantes do gótico, incluindo o manuelino, fruto da sucessão de vários bispos e de vários arquitetos ocorrida ao longo do tempo. Os restauros que se fizeram nos séculos seguintes levaram ao acrescentamento de elementos de outros estilos, mas na transição do séc. XIX para o séc. XX foi reposta muita da sua traça original, que é a que hoje se vê, graças ao arquiteto Rosendo Carvalheira.
A Sé da Guarda está orientada no sentido nascente-poente e com a capela-mor virada para nascente, como era hábito nas igrejas, mas é a sua fachada lateral virada a norte que mais impressiona. Vêmo-la de baixo para cima, o que nos dá uma sensação de particular grandiosidade deste magnífico templo. O portal principal, que está virado para poente e é em estilo manuelino, também merece a nossa admiração.
Se por fora a Sé da Guarda é um templo notável, ainda mais notável é ela por dentro. A beleza simples mas harmoniosa e a amplidão do seu interior dão-nos uma impressão de grande elevação e misticismo. É, inquestionavelmente, uma catedral gótica, que convida a nossa alma a subir para o céu.
Aspeto do interior da Sé da Guarda (Foto de autor desconhecido)
De grande beleza e enorme valor artístico é também o retábulo do altar-mor, atribuído ao escultor francês João de Ruão (Jean de Rouen), que viveu no séc XVI, passou a maior parte da sua vida em Coimbra e tanta e tão maravilhosa escultura deixou neste cantinho da Europa chamado Portugal.
Retábulo renascentista da Sé da Guarda (Foto: Celestino Manuel)
Dir-me-ão: «Pois sim, a Sé da Guarda é muito bonita, as igrejas da Misericórdia e de São Vicente também são, a antiga Judiaria é um belo bairro medieval e o Museu da Guarda merece uma visita muito atenta. Mas quem é que se atreve a ir à Guarda neste tempo de neves e de geadas?» Eu respondo que a Guarda tem uma hospitalidade franca e aberta, que é própria das gentes beiroas e que compensa, com o aconchego do seu calor humano, o frio, os ventos e as neves desta que é a cidade mais alta de Portugal.