São Pedro das Águias
A ermida de São Pedro das Águias, Granjinha, Tabuaço (Foto: jorgsant)
Há lugares que parecem ter feitiço. Depois de os termos visitado, não mais voltamos a ser os mesmos, porque uma parte nós ficou presa nesses lugares. A ermida cisterciense de São Pedro das Águias é um lugar assim. Parece que tem feitiço.
A ermida de São Pedro das Águias é um pequeno templo em estilo românico, supõe-se que construído por volta do séc. XIII, a avaliar pelos motivos escultóricos que apresenta. Fica nas proximidades de uma localidade chamada Granjinha, que pertence ao concelho de Tabuaço, e acede-se a ela a partir da estrada nacional que liga Tabuaço a Moimenta da Beira. A ermida fica situada sobre uma espécie de plataforma inclinada, entre um fraguedo e o fundo do vale do rio Távora, que é um afluente da margem esquerda do Douro.
A entrada principal da ermida (Foto: Município de Tabuaço)
O que mais surpreende nesta bela ermida é a sua extraordinária proximidade de uma escarpa rochosa, da qual dista muito menos de um metro, e é, sobretudo, o facto de a sua porta principal estar virada para a escarpa e não para o rio. Os fiéis que quiserem entrar na capela pela porta principal só conseguirão entrar um a um, porque terão que se esgueirar entre a capela e a escarpa! A razão para este facto aparentemente estranho reside na tradição cristã de construir os templos com a porta principal virada a poente e a capela-mor virada a nascente. Neste caso, o poente fica do lado da escarpa; logo, a porta principal está do lado da escarpa e não do lado contrário.
O portal da ermida, em estilo tipicamente românico (Foto: Município de Tabuaço)
Como tudo o que é antigo neste país tem uma lenda associada, a ermida de São Pedro das Águias também tem a sua lenda. E como quase todas as lendas neste país envolvem mouros, esta também envolve. A lenda de São Pedro das Águias é a seguinte:
Dois cavaleiros de Entre-Douro-e-Minho, D. Rosendo e D. Tendo, teriam passado o Douro para dar combate aos Sarracenos, então firmados na vertente meridionasl do rio Douro. A fama das façanhas dos dois guerreiros espalhou-se entre os próprios Mouros, a tal ponto que duas filhas do emir de Lamego teriam decidido fugir do alcácer paterno, disfarçadas em trajos masculinos, para se entregarem aos dois paladinos da cruz. Uma dessas jovens mouras, principalmente, de nome Ardinga, sentir-se-ia irresistivelmente propensa a abjurar da sua religião, para se consagrar à crença do guerreiro cristão, D. Tedo, que, ansiosamente, procurava, fugindo à perseguição dos emissários do Emir lançados no seu encalço. Ao cabo de muitos perigos, alcançaram um sítio ermo onde encontraram um eremita, a quem Ardinga teria pedido a aceitação da sua nova fé, a fim de poder contrair matrimónio com o guerreiro cristão, nessa ocasião, ausente. Consumada a abjuração, apareceu de súbito o Emir, com os seus homens de armas. As fugitivas foram aprisionadas e a mais rebelde foi, sem mais hesitações, degolada pelo próprio pai. D. Tedo, vindo pouco depois, quando já o chefe mouro havia regressado aos seus domínios de Lamego e Resende, e sendo informado pelo ermitão do que se passara na sua ausência, teria ficado tão abalado pela morte da jovem sarracena, por ele apaixonada e morta, que nesse mesmo momento teria feito voto de celibato, entregando-se à exclusiva luta pela doutrina de Cristo até à morte, ocorrida em combate em terras de Tabuaço, nas margens do rio que passaria a ter o seu nome, o rio Tedo.
Sant'Anna Dionísio, in Guia de Portugal, volume V (Trás-os-Montes e Alto-Douro), tomo II (Lamego, Bragança e Miranda)
Uma outra versão desta lenda conta que os dois nobres seriam de origem leonesa e que Ardinga, a princesa moura, apaixonada e correspondida num amor impossível, teria fugido não com sua irmã, mas com uma escrava para encontrar D. Tedão (e não D. Tedo), abrigando-se no Mosteiro de S. Pedro de Águias.
Joel Cleto e Suzana Faro, in S. Pedro das Águias, Tabuaço: Os Amores de D. Tedo e Ardinga. O Comércio do Porto. Revista "Domingo", 26 de Setembro de 1999, págs. 21-22
A ermida vista pelo lado norte (Foto: Carlos Castro)
Comentários: 0
Enviar um comentário