31 agosto 2022

Missa em tempo de guerra


Missa N.º 10 em Dó Maior, Hob. XXII/9 (Missa in Tempore Belli), do compositor austríaco Joseph Haydn (1732–1809), por Yeree Suh (soprano), Ulrike Mayer (contralto), Uwe Gottswinter (tenor), Christof Hartkopf (baixo), o coro de rapazes Pardais da Catedral de Regensburg, da Alemanha, e a Orquestra Barroca L'Orfeo, da Áustria, sob a direção de Roland Büchner. O coro Pardais da Catedral de Regensburg foi fundado no séc. X

29 agosto 2022

Um magnífico retábulo


Túmulo do bispo D. Jorge de Melo com retábulo, de Nicolau Chanterene (c.1485–1551). Convento de Nossa Senhora da Conceição ou de São Bernardo, Portalegre (Foto: Edmundo M)

A cidade de Portalegre não é grande, mas tem muito que ver: a Sé Catedral, o Castelo, o Museu da Tapeçaria, o Museu-Biblioteca Municipal e muito mais. Tem, além disso e sobretudo, a Casa-Museu de José Régio, que considero de visita obrigatória. Dotada de um recheio notável, com destaque para as muitas dezenas de Cristos e outras peças de arte sacra que José Régio colecionou ao longo da sua vida, esta é uma casa que o poeta disse ser
«Cheia dos maus e bons cheiros
Das casas que têm história,
Cheia da ténue, mas viva, obsidiante memória
De antigas gentes e traças,
Cheia de sol nas vidraças
E de escuro nos recantos,
Cheia de medo e sossego,
De silêncios e de espantos,
— Quis-lhe bem como se fora
Tão feita ao gosto de outrora
Como as do meu aconchego.»
(Excerto da Toada de Portalegre).

Além de tudo isto, há em Portalegre um monumento que algumas pessoas julgarão que não podem visitar, porque tem estado ocupado pela Guarda Nacional Republicana. Refiro-me ao Convento de Nossa Senhora da Conceição, também chamado Convento de São Bernardo. Então é assim: também é possível visitar este convento, que data do séc. XVI, desde que na unidade da GNR nele ainda instalada haja algum militar que esteja disponível para acompanhar os visitantes.

Além do edifício propriamente dito, de estranha arquitetura em resultado das muitas intervenções feitas ao longo dos séculos, podem admirar-se neste convento preciosos painéis de azulejos setecentistas e, sobretudo, o extraordinário túmulo de D. Jorge de Melo, que foi bispo da Guarda. Este túmulo é uma obra-prima, cuja autoria tem sido atribuida a Nicolau Chanterene, escultor francês radicado em Portugal. Além da arca tumular com uma estátua jacente de D. Jorge de Melo, é de destacar, sobretudo, o retábulo primorosamente esculpido em mármore de Estremoz, tendo como figuras centrais Santa Ana e São Joaquim. A não perder em Portalegre.

23 agosto 2022

O primeiro filme de Charlie Chaplin



Making a Living, 1914, filme mudo de Henry Lehman, com Charlie Chaplin (1889–1977), Henry Lehman (1881–1946) e outros

Making a Living é o título do primeiro filme protagonizado por Charlie Chaplin, apenas como ator. Foi rodado em três dias nos estúdios da Keystone, em Los Angeles, Estados Unidos, e estreado em 1914. O realizador do filme foi Henry Lehman, que também foi ator e contracenou com Chaplin.

Consta que Charlie Chaplin não gostou do filme, mas algum haveria de ser o seu primeiro. Logo depois deste, Chaplin teve a oportunidade de dar largas ao seu génio, com a criação da personagem que o celebrizou para sempre: Charlot, que no Brasil foi chamado Carlitos.

Em Making a Living, Charlie Chaplin surge como um vigarista sedutor e sem dinheiro, mas bem vestido, de cartola, monóculo e bigode de pontas caídas, praticamente nos antípodas da figura enternecedora de Charlot. O filme é mudo, evidentemente, e tem a duração de cerca de 12 minutos e meio.

19 agosto 2022

Uma "batalha" musical


Batalha do 5º Tom, de Frei Diogo da Conceição, compositor e organista português que viveu em Braga no séc. XVII, pelo organista mexicano Heriberto Raymundo Moreno Baeza

13 agosto 2022

Uma escultura maconde


Mãe ajoelhada com um filho, finais do séc. XIX, escultura de madeira de autor anónimo do povo Maconde, região fronteiriça entre Moçambique e Tanzânia. Kimbell Art Museum, Fort Worth, Texas, Estados Unidos da América

07 agosto 2022

Carta à Minha Filha, de Ana Luísa Amaral

Lembras-te de dizer que a vida era uma fila?
Eras pequena e o cabelo mais claro,
mas os olhos iguais. Na metáfora dada
pela infância, perguntavas do espanto
da morte e do nascer, e de quem se seguia
e porque se seguia, ou da total ausência
de razão nessa cadeia em sonho de novelo.

Hoje, nesta noite tão quente rompendo-se
de junho, o teu cabelo claro mais escuro,
queria contar-te que a vida é também isso:
uma fila no espaço, uma fila no tempo
e que o teu tempo ao meu se seguirá.

Num estilo que gostava, esse de um homem
que um dia lembrou Goya numa carta a seus
filhos, queria dizer-te que a vida é também
isto: uma espingarda às vezes carregada
(como dizia uma mulher sozinha, mas grande
de jardim). Mostrar-te leite-creme, deixar-te
testamentos, falar-te de tigelas — é sempre
olhar-te amor. Mas é também desordenar-te à
vida, entrincheirar-te, e a mim, em fila descontínua
de mentiras, em carinho de verso.

E o que queria dizer-te é dos nexos da vida,
de quem a habita para além do ar.
E que o respeito inteiro e infinito
não precisa de vir depois do amor.
Nem antes. Que as filas só são úteis
como formas de olhar, maneiras de ordenar
o nosso espanto, mas que é possível pontos
paralelos, espelhos e não janelas.

E que tudo está bem e é bom: fila ou
novelo, duas cabeças tais num corpo só,
ou um dragão sem fogo, ou unicórnio
ameaçando chamas muito vivas.
Como o cabelo claro que tinhas nessa altura
se transformou castanho, ainda claro,
e a metáfora feita pela infância
se revelou tão boa no poema. Se revela
tão útil para falar da vida, essa que,
sem tigelas, intactas ou partidas, continua
a ser boa, mesmo que em dissonância de novelo.

Não sei que te dirão num futuro mais perto,
se quem assim habita os espaços das vidas
tem olhos de gigante ou chifres monstruosos.
Porque te amo, queria-te um antídoto
igual a elixir, que te fizesse grande
de repente, voando, como fada, sobre a fila.
Mas por te amar, não posso fazer isso,
e nesta noite quente a rasgar junho,
quero dizer-te da fila e do novelo
e das formas de amar todas diversas,
mas feitas de pequenos sons de espanto,
se o justo e o humano aí se abraçam.

A vida, minha filha, pode ser
de metáfora outra: uma língua de fogo;
uma camisa branca da cor do pesadelo.
Mas também esse bolbo que me deste,
e que agora floriu, passado um ano.
Porque houve terra, alguma água leve,
e uma varanda a libertar-lhe os passos.

Ana Luísa Amaral (1956–2022)


(Foto de autor desconhecido)

04 agosto 2022

José de Brito


Dançarina ou Mulher de Preto, c. 1891, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Paço Ducal, Fundação da Casa de Bragança, Vila Viçosa

Mártir do Fanatismo, c. 1895, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Lisboa

Teto pintado por José de Brito (1855–1946). Teatro Nacional de São João, Porto

Batismo de Cristo, pintura a óleo de José de Brito (1855–1946). Igreja da Trindade, Porto

Garçon Jouant avec des Chats, de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem com animais, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Vista de Praia com Capela do Senhor da Pedra ao Fundo (Miramar), óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Natureza Morta—Vaso de Flores, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Retrato de Senhor, 1921, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem com Árvores, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem com Árvores e Ribeiro, aguarela sobre papel de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Mendigo, pastel sobre papel de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Ribeiro com Nora, 1909, aguarela sobre papel de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Porto, aguarela sobre papel de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Napolitana, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Batismo de Cristo, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Paisagem Campestre, óleo sobre tela colada em cartão prensado de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Um Trecho do Rio Portuzelo, 1909, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Varinas e Pescador, 1918, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Rosas, óleo sobre tela colada em cartão de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Retrato de Senhora, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Vista do Douro, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Implantação do Liberalismo, óleo sobre madeira de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Figura de Nobre, 1909, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Retrato de Senhora, 1909, carvão sobre papel de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Retrato de Senhora Idosa, óleo sobre tela, assinatura ilegível, provavelmente de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

Nu Feminino com Flores, óleo sobre tela de José de Brito (1855–1946). Coleção particular

José de Brito foi um pintor português, nascido em Santa Marta de Portuzelo, Viana do Castelo, no ano de 1855.

Aos 18 anos de idade, José de Brito inscreveu-se na Academia Portuense de Belas-Artes, onde foi aluno de Soares do Reis, Almeida Furtado e João Correia, entre outros, e foi colega de Henrique Pousão. Quando terminou o curso, regressou à sua freguesia natal, onde se dedicou à pintura de paisagens e de temas etnográficos locais.

O escritor Ramalho Ortigão veio a conhecer José de Brito pessoalmente e entusiasmou-se tanto com o seu talento, que propôs a quem de direito que lhe fosse atribuido um subsídio, para poder aprofundar os seus estudos no estrangeiro. Respondendo à proposta, o marido da rainha D. Maria II, D. Fernando de Saxe-Coburgo, o Rei-Artista, atribuiu-lhe uma bolsa de estudo e José de Brito rumou a Paris, onde estudou na Academia Julien. Após o falecimento de D. Fernando, José de Brito continuou a ser subsidiado pelo Estado até ao ano de 1890, quando achou que já era capaz de viver da sua arte sem precisar de subsídios.

Em 1896, José de Brito regressou a Portugal e tornou-se professor de Desenho Histórico na Academia Portuense de Belas-Artes. Em 1929 jubilou-se, mas continuou a exercer a sua atividade como pintor, com atelier no edifício da atual Biblioteca Pública Municipal do Porto, em frente ao jardim de São Lázaro. Ao longo da sua vida, José de Brito privou com alguns dos maiores vultos da cultura portuguesa do seu tempo, como Camilo Castelo Branco, Eça de Queirós, Silva Porto, Marques de Oliveira, Sousa Pinto, etc.

José de Brito faleceu na cidade do Porto em 1946, com 91 anos de idade.

02 agosto 2022

Surf no meio da cidade


Um cartaz de uma competição de surf... em Munique!

A cidade de Munique, capital da Baviera, no sul da Alemanha, fica a centenas de quilómetros do mar. No entanto, ninguém se espante se vir um adolescente entrar numa carruagem do metro com uma prancha de surf debaixo do braço.

«Quem não tem cão, caça com gato», diz o nosso povo. Neste caso, quem não tem mar, faz surf no rio. E se o rio não tiver ondas, porque a cidade é plana, como é que se faz? Geram-se ondas artificiais e o problema fica (mais ou menos) resolvido. É certo que não são ondas iguais às do mar, mas são o melhor que se pode arranjar.

Em 1972 foi criada em Munique a primeira onda fluvial de surf do mundo, uma onda muito certinha, que não oferece quaisquer surpresas e que ainda existe. Deve ser a onda ideal para principiantes. Esta onda fica em Floßlände, na zona sul da cidade e bastante longe do centro, e é feita com água desviada do Rio Isar. Na sua vizinhança, situa-se um excelente parque de campismo e uma praia fluvial extraordinariamente aprazível, onde o nudismo está legalizado e é praticado por quase toda a gente como se estivesse no paraíso, e está mesmo. Um pouco mais afastado, encontra-se o jardim zoológico da cidade.

A onda de surf de Floßlände, no sul de Munique

Em vista do êxito conseguido pela onda de Floßlände, decidiu-se fazer uma outra, maior e mais alta, num rio artificial alimentado por águas subterrâneas que já existia, chamado Eisbach. Este rio atravessa o Englischer Garten, que é um magnífico parque situado muito perto do centro da cidade. Ainda por cima, a onda de Eisbach foi feita à entrada do parque para quem vem do centro, isto é, ela fica praticamente no próprio coração da cidade de Munique! Dada a sua localização central, a onda de Eisbach atrai numerosos surfistas e ainda mais numerosos mirones, que se acumulam nas margens do rio e se debruçam numa ponte sobranceira ao local para ver as habilidades deles.


A onda de surf de Eisbach, no centro de Munique. Neste vídeo, além das proezas do surfista que o fez, podem ver-se fugazes imagens da bela e hospitaleira cidade de Munique: Englischer Garten, Marienplatz, Viktualienmarkt, Odeonsplatz, Maximilianeum, etc.