Sonata "Ao Luar", de Beethoven
Sonata para Piano N.º 14 em dó sustenido menor, Op. 27, N.º 2 ("Ao Luar"), de Ludwig van Beethoven (1770–1827), pelo pianista chileno Claudio Arrau (1903–1991)
Dá-nos, Senhor, aquela PAZ inquieta
Que denuncia a PAZ dos cemitérios
E a PAZ dos lucros fartos.
Dá-nos a PAZ que luta pela PAZ!
A PAZ que nos sacode
Com a urgência do Reino.
A PAZ que nos invade,
Com o vento do Espírito,
A rotina e o medo,
O sossego das praias
E a oração de refúgio.
A PAZ das armas rotas
Na derrota das armas.
A PAZ do pão da fome de justiça,
A PAZ da liberdade conquistada,
A PAZ que se faz “nossa”
Sem cercas nem fronteiras,
Que é tanto “Shalom” como “Salam”,
Perdão, retorno, abraço…
Dá-nos a tua PAZ,
Essa PAZ marginal que soletra em Belém
E agoniza na Cruz
E triunfa na Páscoa.
Dá-nos, Senhor, aquela PAZ inquieta,
Que não nos deixa em PAZ!
Para tirar as sardas — trovisco macho, sangue de toupeira, unto de cobra ribeirinha e vinagre puro.
Amassa-se tudo e põe-se na cara, ao deitar na cama, três noites a fio, mas só se lava a cara no fim dos três dias. É «remédio santo».
(…)
Remédio para a dor de cabeça — alecrim, rosmaninho, arruda, politaira, aipo, mentrastos e segurelha. É tudo bem pisado e posto na cova-do-ladrão ao deitar, dizendo-se em seguida:
Com Deus me deito,Aqui neste leito,Deito-me doenteE levanto-me escorreito.Em louvor de Santa Maria,Paz téco, aleluia.— Amen.
Como aborrecer o vinho — pega-se numa cobra viva e afoga-se em meia canada de vinho. Se não for tempo de cobras, também remedeia uma enguia, mas a cobra é melhor.
Quando o bêbedo pedir vinho, dá-se-lhe deste. Ao cabo de 24 horas, nunca mais torna a fazê-lo.
Para o pão levedar depressa — pega-se nas calças de um homem (que não use ceroulas), viram-se do avesso e põem-se sobre a massa, com um rosário bento em cima. (De notar a analogia entre o símbolo da potência masculina e o crescimento da massa.)
Para tirar o pano da cara — esfrega-se bem a cara com cueiros ainda húmidos.
Para conservar a vista — esfrega-se os olhos com ovos ainda quentes e pouco limpos.
Para curar ougamentos1 — come-se atrás da porta um bolo quente, com azeite e alho, e enterra-se o que sobrar. Aliás, fica ougado o animal que o comer.
Para preservar do diabo as casas — prega-se em cada porta, postigo e janela, uma cruzinha de trovisco macho.
Mas neste arsenal, existem igualmente os acautelatórios. E assim, quem quiser «zombar de bruxas e feiticeiras» deve trincar e mastigar, todos os dias, ao levantar da cama, um bocado de alho verde.
E, finalmente, esta «receita» que poderá, eventualmente, ser útil a alguma leitora em transes semelhantes:
Para a moça fazer andar o rapaz sempre «à cordinha», até que ele se resolva a casar com ela — traga, numa bolsinha pregada no colete, sobre o peito esquerdo, um osso de cão, outro de gato e outro de defunto, com um bocadinho de terra do caixão do mesmo, três folhas de ruda (arruda), três de alecrim macho e um alho verde. Lave bem o corpo em cruz — desde as pontas dos dedos da mão direita até às pontas dos dedos do pé esquerdo — e das pontas dos dedos da mão esquerda até às pontas dos dedos do pé direito. Sirva depois ao dito cujo rapaz café ou chocolate, preparado com aquela água, e ovos fritos, partidos no cachaço dele. É receita magnífica e muito experimentada.
Fizemos a amostragem de um receituário que nos chegou, pelo menos do século XIX (mas com origem certamente mais remota) Disparates, infantilidades, crenças pueris. Instantâneos de certa vida portuense — cada um chame-lhe o que entender — são, também, componentes de outra face da personalidade tripeira que se desvenda. Sem nenhum propósito apologético. Sem nenhuma simpatia pelas práticas. (Mas com muita simpatia pelas pessoas que as praticavam. Com as suas razões: abandono, atraso cívico, dificuldades, analfabetismo, isolamento, más habitações, superstição. Mudámos assim tanto as causas do sofrimento e do subdesenvolvimento para nos rirmos delas? E será a crença nas virtudes de um pó ou de uma bisnaga, impostos pela TV, superior à crença nas mulheres de virtude? Vale mais a «crença» electrónica do que a crença nas palavras e nos gestos — que se crêem — mágicos?)
1 — De ougar: palavra que significa «aguar», muito usada pelas camadas populares do Porto. O ougamento é o desejo de comer ou beber qualquer coisa (à mulher grávida, deve-se dar tudo o que lhe apetecer, para que ela «não ougue»).
Hélder Pacheco, Tradições Populares do Porto, 3.ª Edição, Editorial Presença, Lisboa, 1991
MINHA HOMENAGEM AO QUERIDO ARITANA YAWALAPITI”
Quando menino escutava a musica de abertura de uma novela em preto e branco chamada "Aritana". Achava fascinante os povos indígenas e sua luta para salvar a aldeia dos invasores. O tempo passou e um dia sentado na sala da casa de Orlando Villas Bôas, vejo entrar pela porta o grande cacique Aritana. Olhou para mim e sorriu. Eu falante que sou, emudeci de emoção e silenciei. Respirei fundo e fiz apenas uma pergunta: "Aritana, me leva para o Xingu?!"
Ele riu pois achou engraçado do jeito que eu falei. Orlando deu uma gargalhada e disse, "Leva ele e não traga de volta não!". Rimos e conversamos durante horas e naquele dia nasceu nossa amizade. Aritana foi um homem especial e amado por toda sua gente. Neste momento os peixes no rio Xingu choram, as onças na mata choram, os passarinhos deixaram de voar neste dia triste. Triste ficamos aqui na terra dos viventes. Minhas lentes e minhas maquinas se trancaram na escuridão pois sem a luz não há fotografia. Segue em paz sua jornada para o Ivati encontrar-se com os seus e contar novas historias.