30 janeiro 2022

Um compositor de Estremoz


Abertura da ópera L'Amore Industrioso, de João de Sousa Carvalho, nascido em Estremoz em 1745 e falecido algures no Alentejo por volta de 1798. A interpretação é provavelmente da Orquestra Clássica do Porto, dirigida por Meir Minsky

Em finais da década de 80 do século passado, estava eu em Munique quando passei por uma loja de discos. Na montra da loja, estava um CD com as palavras SOUSA CARVALHO na capa. Suspeitando de que este Sousa Carvalho fosse português, embora nunca tivesse ouvido falar dele, entrei na loja e pedi para ver o CD. Confirmei: Sousa Carvalho era português. Pedi para ouvir um pouco do disco e ouvi esta peça, que é a Abertura da ópera "L'Amore Industrioso" do dito Sousa Carvalho. Comprei imediatamente o disco, que era de origem... húngara! Senti vergonha de mim mesmo. Encontrei na Alemanha um CD húngaro com música de um português que eu (que sou português) não conhecia!

27 janeiro 2022

mesmo que o silêncio…


mesmo que o silêncio seja este zumbido
que suporta o ruído das páginas
já muito antes no coração as folhas
tombavam na corrente sem dizerem nada
e sobre a sua morte aconteciam as árvores
futuras

vendo-as cair os pássaros aprendiam
o voo
antes das asas

Carlos Nogueira Fino

(Imagem de autor desconhecido)

20 janeiro 2022

As Catorzinhas de Moçambique


As Catorzinhas de Moçambique, um vídeo de Reginaldo Bianco, baseado num roteiro de Guilherme Vasconcelos, sobre adolescentes pobres, que homens muito mais velhos seduzem e que acabam por cair na prostituição

16 janeiro 2022

Uma Pietà em Óbidos


Igreja de Santa Maria, Óbidos (Foto: milosk50 / shutterstock)

Óbidos dispensa apresentações. Os elogios que são dirigidos a esta vila de recorte medieval são constantes e são plenamente merecidos. Óbidos exerce um fascínio irresistível sobre todos os que a visitam.

Se me perguntarem o que merece ser visto em Óbidos, responderei sem hesitar: «Tudo. As ruas, as casas, a muralha, as igrejas, a Porta da Vila, o castelo, o pelourinho, as flores, enfim, tudo». Se, mesmo assim, insistirem comigo para que individualize em Óbidos um ponto de interesse que sobreleve todos os demais, então responderei: «O túmulo de D. João de Noronha, o Moço, que está na Igreja Matriz, dedicada a Santa Maria». Para mim, pelo menos, é a joia mais preciosa de todas quantas existem em Óbidos, e são muitas.

Quem segue pela Rua Direita (que é torta) e chega à Praça de Santa Maria, onde também está o pelourinho da vila, sente o seu olhar atraído pelo lindo portal renascentista da igreja. Muitas pessoas passam, fotografam, mas não descem para entrar. Não sabem o que perdem.


Túmulo de D. João de Noronha, o Moço, na Igreja de Santa Maria, Óbidos (Foto: Maragato)

O interior da Igreja de Santa Maria é lindíssimo, com as suas paredes revestidas de preciosos azulejos barrocos, o retábulo do altar-mor da autoria do pintor João da Costa, o órgão de tubos, o retábulo de Santa Catarina pintado por Josefa d'Óbidos e, sobretudo, o túmulo de D. João de Noronha, o Moço, em estilo renascentista e da autoria de um grande escultor francês radicado em Portugal, chamado Nicolau de Chanterene, em francês Nicolas de Chantereine (1470–1551).

Em vez de representar um jacente, que é uma reprodução da figura do morto em posição deitada, o túmulo de D. João de Noronha, o Moço, representa uma dramática Pietà, ou seja, a figura de Nossa Senhora com Jesus Cristo morto nos braços.

Este túmulo está inserido num amplo portal com arco de volta redonda, que também é renascentista, mas que é da autoria de outro grande escultor francês, chamado João de Ruão, em francês Jean de Rouen (1500–1580), que viveu em Coimbra.


Pormenor do túmulo de D. João de Noronha, o Moço, na Igreja de Santa Maria, Óbidos. Figura representando Maria Madalena (Foto de autor desconhecido)

11 janeiro 2022

Domingos Vieira, "O Escuro"


Não é difícil adivinhar em que estação do ano foi pintado este quadro cheio de humanidade, representando uma senhora com um casaco cobrindo as orelhas, além de uma touca. Retrato de D. Isabel de Moura, c. 1635, óleo sobre tela de Domingos Vieira, "O Escuro" (c. 1600–1678?). Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, Portugal

Este é o convencional retrato do marido da senhora friorenta representada no quadro anterior. Lopo Furtado de Mendonça, 1635, óleo sobre tela de Domingos Vieira, "O Escuro" (c. 1600–1678?). Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa, Portugal

Domingos Vieira, denominado "O Escuro", foi um pintor português do séc. XVII, nascido e falecido em datas indeterminadas, mas que esteve ativo entre os anos 1627 e 1678. Viveu durante algum tempo em Espanha, onde terá tido contacto com a obra de El Greco, cuja influência se nota na sua pintura.

A época em que viveu Domingos Vieira, "O Escuro", foi um tempo muito duro para Portugal. A dominação espanhola imposta pela dinastia filipina, primeiro, e a Guerra da Restauração, depois, deixaram o país em ruína. A própria aristocracia, tradicionalmente ostentatória, tinha uma vida austera, e isso nota-se nos retratos de membros da nobreza feitos nessa época. O fausto sumptuoso só chegaria mais tarde, durante o reinado de D. João V, com a afluência de ouro do Brasil.

05 janeiro 2022

Missa em sol maior de Carlos Seixas


Missa em sol maior para solistas, coro, orquestra de cordas e baixo contínuo, do compositor português Carlos Seixas (1704–1742), por Alexandra do Ó (soprano), Manuel Braz da Costa (contratenor), António Wagner Diniz (tenor), Coro de Câmara de Lisboa e a Orquestra Barroca Norueguesa, dirigida a partir de um órgão por Ketil Haugsand

Carlos Seixas foi um dos maiores compositores portugueses de sempre. Nascido em 1704 em Coimbra, aprendeu música com o pai, que era organista na Sé Nova, e, com 16 anos de idade, mudou-se para Lisboa. Na capital, tornou-se organista da Sé Patriarcal, assim como da Capela Real, onde pontificava como Mestre o grande compositor italiano Domenico Scarlatti. Paralelamente, Carlos Seixas também foi professor de música, tendo sido muito requisitado pelas famílias nobres da capital. Morreu em Lisboa de febre reumática, em 1742, quando já desempenhava o cargo de Mestre da Capela Real em substituição de Scarlatti.

A música de Carlos Seixas é claramente uma música do seu tempo, uma música indiscutivelmente barroca. No entanto, Carlos Seixas não se limitou a copiar o figurino italiano, alemão ou francês do barroco; ele inovou, criou soluções originais e deu origem ao que poderemos chamar de barroco português, que é um barroco leve e luminoso, como o italiano, mas mais lírico do que este.

01 janeiro 2022

Tempo…


Na luz do tardio amanhecer
no claro-escuro do fim da tarde
no descer da rua
no virar da esquina
no entrar da porta…
já não importa se o tempo vai se o tempo vem.
Tudo hoje é rua
tudo hoje é esquina
tudo hoje é porta de um tempo que se não tem

Adão Cruz