Bairros operários
Painel de azulejos no Bairro Estrela d'Ouro, Graça, Lisboa (Foto de autor não identificado)
No princípio do séc. XX, assistiu-se em Portugal a um grande movimento de pessoas que saíram das aldeias e se fixaram nas cidades, sobretudo nas de Lisboa e do Porto. Este fenómeno social teve como causa principal a implantação do caminho de ferro, que permitiu uma maior facilidade de transporte de pessoas e de mercadorias através do território nacional.
Paralelamente, nas cidades desenvolveu-se a indústria, que usou também o comboio para fazer movimentar os seus produtos e que empregou a mão-de-obra barata que se lhe apresentava em abundância. Foi assim que surgiram alguns núcleos industriais nas cidades, que se situaram preferencialmente em locais que dispunham de acessos fáceis ao caminho de ferro. Foram exemplos destes núcleos Alcântara e o Beato, em Lisboa, e Campanhã, no Porto.
Mas as cidades não estavam preparadas para acolher a quantidade de pessoas que a elas afluíam. Não havia casas que chegassem para receber os recém-chegados. Muitos industriais tomaram então a iniciativa de construir casas em bairros, pátios, "vilas" e "ilhas", para alojarem os operários que empregavam nas suas empresas. A maior parte destes bairros operários era de muito má qualidade. Ainda agora, aqui no Porto, a palavra "ilha" continua a ter muito má reputação. Mas houve casos notáveis, em que foram construídos bairros e pátios para operários que tinham uma qualidade muito superior aos demais. Um exemplo de um tal bairro, ainda nesta cidade, é o Bairro do Comércio do Porto, mandado construir pelos proprietários do jornal "O Comércio do Porto" na viragem do séc. XIX para o séc. XX, junto ao cruzamento entre as ruas da Constituição e Serpa Pinto.
No entanto, os bairros operários mais notáveis que conheço estão em Lisboa e não no Porto. Curiosamente, estão ambos muito próximos um do outro, concretamente na zona da Graça: o Bairro Estrela d'Ouro e a Vila Berta. Há quem lhes junte a Vila Sousa, que fica mesmo no Largo da Graça, mas esta a mim não parece ter o mesmo interesse.
O Bairro Estrela d'Ouro, situado entre a Rua da Graça e a capela da Senhora do Monte, foi mandado construir em 1908 por um imigrante galego que fez fortuna em Lisboa na área da pastelaria, chamado Agapito Serra Fernandes. Ora o sr. Agapito, que fez construir a sua própria residência no meio do bairro, resolveu chamar Estrela d'Ouro ao bairro e espalhar estrelas de cinco pontas por todos os lados. Provavelmente, tratou-se de uma homenagem que ele prestou à cidade de Santiago de Compostela, que no tempo dos romanos se chamava Campus Stellæ, isto é, Campo da Estrela.
Reportagem televisiva sobre o Bairro Estrela d'Ouro
A Vila Berta, situada numa rua perpendicular à Rua do Sol à Graça, na encosta que do Largo da Graça desce para os lados de Santa Apolónia, é uma verdadeira graça... É um oásis de beleza e de paz, que nos faz querer ficar a morar ali para o resto dos nossos dias. Foi construída por volta de 1900 por um tal Joaquim Francisco Tojal, que deu à "vila" o nome da sua filha, que se chamava Berta.
Mesmo que não se tenha tempo para ver mais nada na zona da Graça (e há muito para ver, desde a igreja e miradouro até à Voz do Operário), perca-se ao menos um minuto a admirar a Vila Berta. É um encanto.
Vila Berta, Graça, Lisboa (Foto: Dias dos Reis)
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