O Gaulês Moribundo
O Gaulês Moribundo, Museus Capitolinos, Roma (Foto: Jean-Christophe Benoist)
A estátua de mármore chamada Gaulês Moribundo, que está na Sala do Gladiador do Palazzo Nuovo de Roma, não é uma obra original. É uma cópia, feita na Roma antiga, de uma estátua grega desaparecida. A peça original, que provavelmente seria de bronze, deve ter sido esculpida por volta dos anos 230 a 220 A.C., em Pérgamo, na Ásia Menor, que constitui a parte asiática da atual Turquia. A sua autoria é habitualmente atribuída a Epígonas.
Para os romanos, a estátua certamente representava um gladiador gaulês (celta da Gália, a atual França) ferido de morte. Daí o seu nome corrente de Gaulês Moribundo. Mas os antigos gregos, antes da ocupação romana, não organizavam combates de gladiadores, nem teriam da Gália senão a ideia de ser uma terra distante e bárbara. O que a estátua por certo representa é um guerreiro gálata (celta da Ásia Menor) vencido e moribundo. Ela deve ter sido esculpida para assinalar a vitória do rei de Pérgamo sobre os gálatas, os quais ficaram a partir de então remetidos ao interior do planalto da Anatólia, a região onde se encontra atualmente a capital da Turquia, Ankara.
Os celtas foram um povo que viveu na Europa Central, de onde saiu em duas vagas migratórias nos sécs. VII e V A.C., conquistando e assimilando outros povos e tribos. Espalharam-se por uma grande parte da Europa, incluindo o atual território continental português. Portugal é hoje o terceiro país europeu que tem maior percentagem de topónimos celtas, a seguir à Irlanda e ao Reino Unido.
No séc. III A.C., os celtas que tinham migrado para a Península Balcânica entraram em confronto aberto com os gregos, tendo sido derrotados. Alguns dos celtas atravessaram então o Estreito do Bósforo e instalaram-se na Ásia Menor, onde lhes foi dado o nome de gálatas. Foram estes gálatas que acabaram por ser vencidos, de novo, pelas forças de Pérgamo. A estátua, portanto, deveria chamar-se Gálata Moribundo, em vez de Gaulês Moribundo.
Esta dramática estátua é um dos exemplares mais representativos da escultura helenística. A seu respeito, escreveu Sophia de Mello Breyner Andressen:
No Gaulês Moribundo aparecem dois elementos profundamente novos: a atenção dada ao sofrimento e a atenção dada a um corpo bárbaro (...) a dor que aparece não é o sofrimento do indivíduo, mas o pathos, a grande dor universal.
Comentários: 5
E é assim que se prostitui a historia!!Os principais interessados, que são sempre os mesmos, a que os povos não venham a saber a verdade...éssa estatua encontra-se na wikipedia e
todos nós sabemos que não são virgens de vertus na imformação.As minhas desculpas nos erros ortograficos!! Os meus parabens
Caro manécas Martins, muito agradecido. Não se preocupe com os erros de ortografia. Nota-se que eles são de alguém que deve ter vivido muitos anos longe da terra-mãe.
Prezado Fernando Ribeiro, duas correções são necessárias: 1) gálatas, gauleses e celtas, neste caso, diz respeito ao mesmo povo. Gálata é apenas o nome mais difundido no oriente, mas são os mesmos gauleses (ou celtas, enfim) que migraram da Europa Ocidental para os Balcãs e então para a Ásia Menor; 2) os gregos no período imperial (após a conquista romana) organizavam, sim, jogos gladiatoriais, inclusive no teatro de Dioniso em Atenas (tudo isso é bem documentado na tradição clássica textual). abs, Fabio [fabiomorales@usp.br]
De resto, parabéns pela iniciativa de comentar esta obra, foi um dos poucos sites em português que encontrei com este conteúdo.
Caro Fábio Morales,
Muito obrigado pelas suas amáveis palavras. Não sou um especialista na matéria, muito longe disso, mas achei que seria interessante comentar esta impressionante escultura. Quanto aos pontos que refere, passo a responder:
1) Gálatas, gauleses e celtas são, sim, o mesmo povo, oriundo da Europa Central. Eu não digo o contrário. Gálatas, gauleses e celtas são designações diferentes, usadas apenas em função do espaço geográfico ocupado por este povo: gálatas na Ásia Menor, gauleses na atual França e celtas noutros lados. Celtas é no entanto o nome habitualmente mais utilizado para designar este povo no seu todo.
2) Os jogos gladiatoriais realizados em Atenas a que se refere só tiveram lugar, como diz, após a ocupação romana. Quando escrevi que os antigos gregos não organizavam combates de gladiadores não estava a pensar neste período, mas sim na época em que a estátua original foi esculpida. De qualquer modo é uma imprecisão que vou corrigir de imediato. Muito obrigado.
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