Todos os anos na mesma altura
(Foto: Lourenço)
Todos os anos, na mesma altura, quando começa a primavera, mergulho os pés na água fria do mar, num primeiro passeio, por demais sonhado. Sentir o deslizar das pedras da areia entre os dedos, respirar fundo a maresia, deixar o sol entrar lentamente no corpo e sentir a brisa entrelaçada na magia do voo dos pássaros... e não se saber se somos nós que cantamos ou se é a maré que de intensa jorra os seus braços, feitos de pedaços de luar. Se eu soubesse que podia repetir o gesto lento das ondas, enchia as mãos com flocos de nuvens, mergulhava nos dias a face límpida da maré de todas as marés, não deixava morrer de tédio a luz que ilumina o dia e apanhava com os dedos o tempo perdido.”
Agora, que me recordo desses passeios à beira-mar, do caminhar ao longo da areia, os pés gelados, a alma lavada, sei do encontro entre mim e comigo, deixando para trás o rasto das horas que perdidamente gastei a fazer poemas para ti e de como no fim, me sentia como uma gaivota voando livremente sobre o mar.
Isabel Sousa Ribeiro, Pêndulo, edição de autor
Comentários: 3
"apanhava com os dedos o tempo perdido."
Bela expressão!
Vou ou tentar,
Vou tentar apanhar
Lindo poema, lembrei-me do livro de Richard Bach "Fernão Capelo Gaivota" e obviamente, do filme com música de Neil Diamond.
Caro Rogério,
Eu acho que o tempo perdido é como a areia a escoar-se numa ampulheta. Se não o tivermos aproveitado no momento certo, ele fica parado no fundo da ampulheta. A uma ampulheta, porém, podemos virá-la e começar tudo de novo. Na vida, não há ampulheta que se possa virar.
Caro Ricardo,
Li "Fernão Capelo Gaivota" quando o livro foi publicado em Portugal e se tornou num colossal best-seller, mas não me lembro de ter visto o filme. Conheço perfeitamente a canção de Neil Diamond, que deve ser o tema do filme e ouvi vezes sem conta, mas tenho a sensação que estou a ver as imagens do filme pela primeira vez: https://www.youtube.com/watch?v=LBHP_v0ctkY.
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