O Desterrado
O Desterrado, de Soares dos Reis (1847–1889); mármore de Carrara. Museu Nacional Soares dos Reis, Porto (Foto: João Menéres, 1934–2023) (Clicar na imagem para ampliá-la)
António Soares dos Reis foi um escultor português nascido em Vila Nova de Gaia, em 1847, e falecido por suicídio em 1889, também em Vila Nova de Gaia. Estudou no Porto, Paris e Roma, após o que regressou à sua terra natal.
Soares dos Reis fez algumas das mais notáveis esculturas existentes em Portugal, de entre as quais se destaca O Desterrado, que constitui o apogeu da arte escultórica portuguesa no séc. XIX. A respeito desta obra, escreveu o historiador de Arte Pedro Lapa:
A intensidade desta escultura é expressa pelo contraste entre o dinamismo da figura, articulada em dois eixos oblíquos cruzados e o olhar fito no chão, que presentifica uma interioridade onde ecoa um tempo outro. Assim O desterrado torna-se a consciência dolorosa da nostalgia de um tempo impresentificável. As mãos entrelaçadas, o pé apoiado contra a perna ou os lábios contraídos são outros tantos sinais de inquietude dessa consciência ferida a que faz alusão. (...)
Detalhe de O Desterrado, de Soares dos Reis ((1847–1889); mármore de Carrara. Museu Nacional Soares dos Reis, Porto (Foto de autor desconhecido) (Clicar na imagem para ampliá-la)
Detalhe de O Desterrado, de Soares dos Reis ((1847–1889); mármore de Carrara. Museu Nacional Soares dos Reis, Porto (Foto: Duarte) (Clicar na imagem para ampliá-la)
A inspiração para a realização desta escultura por Soares dos Reis veio pelo menos de três lados. Em primeiro lugar, Soares dos Reis terá decidido fazê-la após ter visto em Paris, onde se encontrava como pensionista, uma escultura que muito o terá impressionado: O Desespero, de Joseph Perraud.
O Desespero, de Jean-Joseph Perraud (1819–1876); mármore. Musée d'Orsay, Paris, França (Foto: Jean Schormans) (Clicar na imagem para ampliá-la)
Por outro lado, Soares dos Reis decidiu passar para a pedra os sentimentos expressos por Alexandre Herculano no seu longo poema Tristezas do Desterro, que começa assim:
I.
Terra cara da patria, eu te hei saudado
D'entre as dores do exilio. Pelas ondas
Do irrequieto mar mandei-te o choro
Da saudade longinqua. Sobre as aguas,
Que de Albion nas ribas escabrosas
Vem marulhando branqueiar de escuma
A negra rocha em promontorio erguido,
D'onde o insulano audaz contempla o immenso
Imperio seu, o abysmo, aos olhos turvos
Não sentida uma lagryma fugiu-me,
E devorou-a o mar. A vaga incerta,
Que róla livre, peregrina eterna,
Mais que os homens piedosa, irá depo-la,
Minha terra natal, nas praias tuas.
Essa lagryma acceita: é quanto póde
Do desterro enviar-te um pobre filho.
(...)
O Desterrado, de Soares dos Reis (1847–1889), visto de outro ângulo; mármore de Carrara. Museu Nacional Soares dos Reis, Porto (Foto de autor desconhecido) (Clicar na imagem para ampliá-la)
Hiawatha, de Augustus Saint-Gaudens (1848-1907). Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque, Estados Unidos da América (Foto de autor desconhecido) (Clicar na imagem para ampliá-la)
Soares dos Reis e Saint-Gaudens devem ter trocado abundantes impressões e ideias entre si, enquanto davam corpo às suas peças. Primeiro, foram modelando o gesso até conseguirem obter as formas que pretendiam; depois, passaram estas formas para as respetivas obras definitivas, em mármore de Carrara. O estudo em gesso de O Desterrado encontra-se presentemente em Lisboa, no Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, e a escultura definitiva está no Porto, no museu que acabou por tomar o nome do escultor, o Museu Nacional Soares dos Reis, e que tinha sido o primeiro museu de arte a ser criado em Portugal, por iniciativa do rei D. Pedro IV.
O Desterrado, de Soares dos Reis (1847–1889); gesso patinado. Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Lisboa (Foto de autor desconhecido) (Clicar na imagem para ampliá-la)
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