15 abril 2012

Poema da Terra Adubada


Por detrás das árvores não se escondem faunos, não.
Por detrás das árvores escondem-se os soldados
com granadas de mão.

As árvores são belas com os troncos dourados.
São boas e largas para esconder soldados.

Não é o vento que rumoreja nas folhas,
não é o vento, não.
São os corpos dos soldados rastejando no chão.

O brilho súbito não é do limbo das folhas verdes reluzentes.
É das lâminas das facas que os soldados apertam entre os dentes.

As rubras flores vermelhas não são papoilas, não.
É o sangue dos soldados que está vertido no chão.

Não são vespas, nem besoiros, nem pássaros a assobiar.
São os silvos das balas cortando a espessura do ar.

Depois os lavradores
rasgarão a terra com a lâmina aguda dos arados,
e a terra dará vinho e pão e flores
adubada com os corpos dos soldados.

António Gedeão, in Linhas de Força


(Foto de autor desconhecido)

Comentários: 2

Blogger Rogério G.V. Pereira escreveu...

Estarão por lá os corpos dos soldados
Faltam, aos lavradores, campos semeados

(acho que o poeta morreu sem o saber
ou, sem isso ver)

15 abril, 2012 01:32  
Blogger Fernando Ribeiro escreveu...

Alguns dos soldados eram também lavradores antes de serem mandados para a guerra pelos poderosos. Não são os corpos dos poderosos que adubam a terra rasgada pelos arados.

17 abril, 2012 01:07  

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